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Economia

China 1x0

País perde espaço para os chineses na "briga" por mercado. Brasil precisa trabalhar melhor produtos de maior valor agregado.

Em 2006, o Brasil vendeu US$ 207 milhões em celulares para o Chile. No mesmo ano, a China exportou para lá US$ 24,6 milhões do mesmo produto. No ano passado, a exportação brasileira de celulares para o Chile havia caído para US$ 84 milhões, enquanto a chinesa aumentou quase dez vezes e chegou a US$ 217 milhões, o que colocou o item como segundo mais importante nas vendas do país asiático aos chilenos.

A perda de antigos e tradicionais mercados brasileiros para a China tem sido a regra nos últimos anos em diversos mercados espalhados pelo mundo. Mas há exceções – o Brasil ganhou algumas “disputas” com a China. Entre 1995 e 2008, o ganho de mercado líquido do Brasil na competição com algumas mercadorias “made in China” em um total de 11 blocos regionais foi de US$ 13,6 bilhões.

O maior ganho veio das vendas ao continente asiático, com vantagem de US$ 6,3 bilhões. A notícia é boa, mas, no mesmo período, a China ganhou muito mais espaço nos mercados em que concorreu com o Brasil. E o ganho foi muito maior – de US$ 512,5 bilhões, segundo estudo do escritório brasileiro da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal).

O levantamento pesquisou itens de venda comum entre os dois países e detectou os produtos nos quais, no mesmo país ou região, houve ganho de participação de mercado do Brasil e simultânea perda pela China. E vice-versa. A conta levou em consideração os onze blocos regionais mais importantes para os quais os dois países vendem . Os resultados foram levantados com a aplicação dos percentuais de ganho ou perda sobre os valores efetivamente exportados para cada mercado em 2008.

Para Renato Baumann, economista da Cepal e um dos autores do estudo, a diferença revela a alta competitividade ganha pelos chineses. Segundo ele, o estudo mostra que nos últimos 15 anos foram criadas oportunidades de exportação que o Brasil aproveitou em parte, mas a China soube fazê-lo muito mais. Para os EUA, por exemplo, o Brasil teve ganho de mercado equivalente a US$ 4,16 bilhões em produtos que concorreram com os chineses. A vantagem da China foi de US$ 143,3 bilhões. A explicação, diz Baumann, é que os chineses tomaram espaço na venda de produtos de maior intensidade tecnológica e, por isso, de maior valor agregado.

Na Europa Ocidental, a diferença de ganhos foi maior ainda. O Brasil ficou com US$ 268 milhões e a China, US$ 144,5 bilhões. Na Ásia, foram US$ 6,3 bilhões de vantagem para os produtos brasileiros contra US$ 137,65 bilhões das mercadorias embarcadas pela China. “Uma evidência da grande competitividade alcançada pelos produtos chineses foram os ganhos obtidos pela China na América do Sul, na venda a países que são vizinhos ao Brasil, regiões nas quais teoricamente, os exportadores brasileiros teriam vantagens, como proximidade geográfica e tradição”, diz Baumann.

Na América do Sul, aponta a pesquisa, o Brasil conseguiu, entre 1995 e 2008, um avanço equivalente a US$ 665 milhões na exportação de produtos que competem com os chineses. A China, porém, conseguiu ganho de US$ 17 bilhões. Ampliando para a América Latina, a situação é mais preocupante, O avanço chinês foi de US$ 36,5 bilhões enquanto o resultado líquido do Brasil ficou negativo em US$ 698 milhões. A elevada vantagem da China decorre da rápida mudança da sua pauta de exportação, diz Lia Valls, professora da Fundação Getulio Vargas (FGV). “A China passou de exportadora de quinquilharias a vendedora de produtos de maior valor adicionado, como eletrodomésticos.”

José Augusto de Castro, da AEB, chama a atenção para a estratégia da China na América do Sul, com a tentativa constante de realizar acordos bilaterais que facilitam ainda mais sua entrada no mercado. A China tem dois acordos bilaterais com países sul-americanos.

O primeiro, com o Chile, foi assinado em 2006. Na época, o Brasil era o terceiro maior fornecedor do Chile, com participação de 12,19% no total de bens importados pelos chilenos. A China estava em quarto lugar, com fatia de 10%. Naquele ano, a partir de outubro, entrou em vigor o acordo bilateral assinado entre o Chile e a China. Em 2009, o Brasil já estava em quarto na lista dos fornecedores do Chile. A China avançou para a segunda posição, perdendo apenas para os Estados Unidos.

Na época da assinatura do acordo, um dos itens que preocupava na competição com os chineses eram os telefones celulares, produto no qual o Brasil perdeu espaço no Chile e a China avançou. “Não é só em razão do acordo que a China conseguiu ganhar mercado, já que os chineses também passaram a vender mais para outros países com os quais não fizeram tratados”, diz Castro. “Mas esse tipo de acerto cria aproximação política que pode abrir outros mercados.”

No início do mês passado, entrou em vigor o acordo bilateral com o Peru que, de forma semelhante ao do Chile, provoca preocupações em segmentos exportadores. O quadro atual, lembra Castro, mostra que o Brasil vai enfrentar a competição chinesa para aproveitar as boas perspectivas de crescimento dos países da América do Sul, um importante destino de manufaturados brasileiros.

Segundo Baumann, entre os produtos nos quais a China ganhou maior espaço que o Brasil na América Latina estão tecidos de algodão, vestuário, produtos químicos, equipamentos de telecomunicação, materiais elétricos e produtos siderúrgicos. “Esse último item chama a atenção. O Brasil vende à China o minério de ferro que retorna à região para ser vendido aos nossos vizinhos em condições mais competitivas”, diz.

Lia Valls lembra também que os chineses têm se aproximado da América Latina por meio de investimentos diretos que trazem junto os fornecedores da China, mas são bem recebidos pelos países de destino pelo efeito benéfico ao dinamismo econômico local.

O estudo da Cepal também aponta o número de produtos no quais o Brasil teve ganho ou perda em relação à China nos 11 mercados selecionados. A quantidade de mercadorias nas quais o Brasil teve vantagem em relação à China é, em todas as regiões, menor do que o número de produtos nos quais teve perda. Na venda aos EUA, o Brasil perdeu posição em 93 produtos, enquanto a China ganhou em 365. Na Europa, foram 83 com vantagem para o Brasil e 409 com perda. Na América do Sul, foram 287 para ganho e 424 para perda.