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Economia

Bric e o resto do mundo

Os países que constituem os Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) estão definidamente na "moda". Leia comentário de Delfim Netto.

Globe shows Asia Australi in a labyrinth of arrows
Globe shows Asia Australi in a labyrinth of arrows

Os países que constituem os Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) estão definidamente na “moda”. A Rússia é uma estrela mais política do que econômica. A China com seu enorme protagonismo parece, de acordo com “projeções” quase consensuais, estar destinada a ser por volta de 2050 o mais brilhante astro com luz própria do cenário mundial. A Índia acelerou seu crescimento e tem um papel estratégico natural. Estes dois últimos países somam mais de 1/3 da população do planeta.

O Brasil, apoiado em instituições e políticas razoáveis e ajudado pelo “bônus” da rápida expansão mundial entre 2003-2008, transformou-se de país devedor em credor. Acumulou reservas da ordem de US$ 240 bilhões e soube aproveitar as condições criadas pela estabilidade produzida pelo Plano Real. No segundo mandato de Lula, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) reacendeu o “espírito animal” do empresariado brasileiro. Combinado com programas sociais bem-sucedidos, eles acabaram criando um robusto mercado interno e boas perspectivas de crescimento.

Nesta semana, reúnem-se os Bric em Brasília para formular políticas que ajudem a consolidação dos seus crescimentos e cooperem com o desenvolvimento mais harmônico de toda a economia mundial. Não é segredo que a China é, hoje, o mais importante parceiro do Brasil no comércio internacional de produtos agrícolas e minerais e, também, nosso mais temível concorrente nos mercados de produtos industrializados na América Latina. A “conferência” dos Bric será muito útil para resolver alguns contenciosos, como por exemplo: por que a China insiste em manter uma taxa de câmbio subdesvalorizada e usa subsídios implícitos, que prejudicam seriamente alguns setores da indústria brasileira?

Talvez seja este o momento para fazer uma reflexão sobre a posição do Brasil nos Bric e tentar entender para onde vamos. Como todos sabem, o “papel aceita tudo”! Quem não lembra das assombrosas “projeções” de Herman Kahn que o mundo levou a sério durante mais de uma década? Quem não lembra das “projeções” sobre o brilhante futuro da União das Repúblicas Soviéticas? Nos anos 60 do século passado, o mais conhecido livro de introdução aos estudos da economia (o famoso “Economics”, de Paul Samuelson) não apenas fazia “hedge” sobre a possibilidade de um sistema de planejamento sem preço ser eficiente, como “projetava” que a economia da URSS ultrapassaria a americana em torno de 1989! Pois bem, em 1989, por obra do destino, a URSS começou a dissolver-se com a queda do muro de Berlim…

A tabela abaixo nos informa sobre o PIB total (medido em paridade do poder de compra) dos Bric, a taxa “estimada” de crescimento global e a “projeção” para 2030 (para 2050 elas seriam ainda mais duvidosas):

O PIB total mostra que a relação entre China/Brasil, de 4,2 em 2009, será de 7,6 em 2030. É óbvio, entretanto, que o “bem-estar” da população é melhor avaliado quando se comparam os PIB per capita. A tabela abaixo mostra essa relação:

Nas condições desse exercício, Brasil e China teriam em 2030 praticamente o mesmo PIB per capita (equivalente ao que hoje têm Itália e Espanha). O problema é que essas “projeções” têm pouca consistência. Em 2009, os Bric tinham um PIB total da ordem de US$ 15,5 trilhões e o resto do mundo cerca de US$ 53,8 trilhões. O PIB mundial era de US$ 69,3 trilhões. Em outras palavras, eles tinham 22% do total. Suposto o crescimento da primeira tabela, o PIB dos Bric em 2030 seria de US$ 70,2 trilhões, registrando crescimento médio anual de 7,5% ao ano, e teriam 54% do total.

O problema é que no longo prazo, a economia mundial cresce na média a 3% ao ano em termos reais. Com a base de US$ 69,3 bilhões em 2009, ele atingiria em 2030 qualquer coisa como US$ 129 trilhões. Na próxima semana, veremos como essas contas não fecham.

Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento.