Quando, em setembro do ano passado, recebeu uma ligação de Walter Fontana pedindo para que voltasse ao conselho de administração da Sadia, Luiz Fernando Furlan sabia que tinha uma tarefa árdua pela frente depois que a empresa registrou perdas bilionárias por conta de investimentos em derivativos cambiais. Mas prometeu fazer o possível para reerguer a Sadia. Começa a reerguê-la, mas, provavelmente, teve de recorrer ao que menos desejava para consegui-lo: vender a empresa para a concorrente Perdigão, pela qual a própria Sadia fizera uma oferta hostil em julho de 2006.
O retorno de Furlan gerou expectativas elevadas no mercado. Sua volta foi vista como uma forma de a companhia recuperar a credibilidade perdida depois dos investimentos de risco, que levaram à renúncia de Walter Fontana do conselho de administração e à demissão do diretor-financeiro Adriano Ferreira, que, segundo a Sadia, teria sido o responsável pelas operações.
Furlan estava afastado da Sadia desde 2002, quando foi ser ministro do Desenvolvimento do governo Lula, e antes de voltar à empresa para apagar o incêndio dos derivativos estava atuando na Fundação Amazonas Sustentável, onde se mantém até hoje.
Com o retorno de Furlan, alguns analistas e fontes do setor acreditaram que seu perfil mais agressivo e o trânsito no governo poderiam abrir portas para que conseguisse apoio do BNDES para levantar a empresa e mantê-la independente. Isso não ocorreu. As muitas negociações com fundos de private equity que queriam colocar dinheiro na companhia também foram infrutíferas.
Medidas de ajustes, como o enxugamento do quadro de diretores e gerentes, e tentativa de vender ativos também foram tomadas, mas estavam longe de solucionar o rombo na Sadia.
Com as opções de capitalização pelo BNDES ou fundos descartadas, restou a negociação com a Perdigão, tarefa que as famílias controladoras delegaram ao ex-ministro.
Parte da família dos controladores já dava indicações do desejo de vender a empresa, mas esse não era o caso de Furlan, que nunca disfarçou a rivalidade entre Sadia e Perdigão.
“Diante das circunstâncias em que a Sadia se encontrava, Furlan se saiu bem, melhor do que o esperado”, diz um analista do setor de carnes , mencionando a dívida de R$ 8,5 bilhões de 2008 e o risco de insolvência. Mas há quem avalie que o fato de ele não ter conseguido que a empresa se viabilizasse sozinha novamente representa uma derrota para o ex-ministro.
Dentro da Sadia, a negociação com a Perdigão está sendo considerada a melhor saída para todos os acionistas, já que evitou a quebra da empresa, embora haja uma certa sensação de fracasso entre executivos antigos na casa.
“Furlan se saiu bem politicamente. Não conseguiu apoio do BNDES, mas com a operação evitou a falência da Sadia”, observa um empresário do agronegócio.
O ex-ministro conseguiu ainda marcar posição, levando a Perdigão a ceder em alguns pontos e obtendo co-presidência do conselho da nova companhia, ao lado de Nildemar Secches.
Apesar de ter evitado a quebra da companhia, Luiz Furlan teve de aceitar a exposição negativa que sofreu. Conforme apurou o Valor, o abalo na credibilidade da companhia foi tão profundo, com os derivativos, que nem mesmo interlocutores importantes do governo tinham receio de falar que o BNDES ajudaria a Sadia desde que a família se afastasse da gestão ou vendesse o negócio à concorrente. O máximo que Furlan conseguiu foi um empurrãozinho do governo no apetite da Perdigão.
O negócio que cria a “gigante brasileira” para o setor de alimentos, como já ocorreu em outros setores, tinha agentes de ambos os lados no governo.
A Previ, Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil, tinha especial interesse na transação, já que sai fortalecida e como a maior acionista isolada. Além de participar do bloco de controle da Perdigão, é a maior minoritária da Sadia, com 8,6% do capital total da empresa – a maior parte em ações preferenciais para evitar o conflito.