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Financiamento

BNDES cortará linha de capital de giro

Restrição da modalidade adotada na crise explica decisão de capitalizar banco em R$ 80 bilhões.

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) vai restringir a concessão de empréstimos para capital de giro das empresas. Essas operações, que somaram cerca de R$ 12 bilhões nos últimos 12 meses, são atípicas para o banco e só foram concedidas por causa da crise financeira internacional. Agora, o BNDES quer reduzi-las drasticamente para destinar recursos a suas linhas tradicionais de financiamento.

Na quarta-feira, o governo anunciou empréstimo de R$ 80 bilhões ao BNDES, em recursos do Tesouro Nacional. O valor cogitado anteriormente era de R$ 100 bilhões. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou a concordar com o valor, mas, numa demorada reunião na noite de terça-feira, com a presença do ministro da Fazenda, Guido Mantega, e do presidente do BNDES, Luciano Coutinho, decidiu-se reduzir o aporte para R$ 80 bilhões.

Com uma carteira de projetos de financiamento já aprovados no total de R$ 160 bilhões, o banco pediu R$ 100 bilhões para bancar os desembolsos previstos para 2010 – a estimativa é liberar R$ 126 bilhões. O governo, no entanto, está apostando na recuperação do mercado de capitais nos próximos meses, o que ajudaria a suprir parte da demanda das empresas por empréstimos de prazo mais longo.

Se o mercado não providenciar os recursos, o governo fará novo aporte no BNDES no próximo ano, segundo decisão já tomada pelo presidente Lula. Os valores anunciados na quarta-feira são suficientes para bancar o orçamento do banco em 2010, mas de maneira apertada. “Trata-se de um número com pouca folga”, comentou uma fonte oficial.

Para 2011, o governo estudará, junto com o BNDES, a criação de novas fontes permanentes de recursos para o banco, uma vez que as existentes hoje, principalmente os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), só garantem um orçamento anual em torno de R$ 60 bilhões. O Ministério da Fazenda resiste à adoção de novos impostos para essa finalidade ou à vinculação dos recursos de tributos já existentes. Prefere que as operações de apoio sejam sempre negociadas.

O assunto será discutido ao longo do ano que vem e sua definição também dependerá da evolução do mercado de capitais. O mercado acionário e de debêntures se recuperou da crise de forma bastante robusta a partir do segundo semestre. Até o momento, as emissões de ações cresceram 20,3% em volume em relação ao ano passado, para R$ 45,7 bilhões – e ainda há duas ofertas em andamento para este ano. As emissões de debêntures atingiram R$ 19,2 bilhões até agora, quando se somam as ofertas públicas e as colocações restritas (máximo de 20 investidores qualificados, sem registro na Comissão de Valores Mobiliários). Esse valor representa crescimento de 130% sobre as emissões de debêntures de 2008, que foram de R$ 9 bilhões – excluídos os papéis emitidos pelas empresas de leasing, que eram usadas pelos bancos para captar recursos sem recolhimento de compulsório.

Uma das medidas do pacote de estímulo ao investimento anunciado há dois dias prevê a participação do BNDES em operações de emissão de debêntures. Durante cinco anos, o banco vai dispor de R$ 10 bilhões para comprar, no mínimo, 20% de debêntures emitidas por companhias não financeiras. Para cada R$ 1 colocado pelo banco, o mercado terá que colocar R$ 4. Com isso, o banco poderá alavancar até R$ 50 bilhões em debêntures, nesse período, para as empresas. “É uma maneira inteligente de alavancar o mercado”, disse uma fonte oficial.

O BNDES participará de emissões de debêntures apenas das empresas que tiverem grau de investimento ou uma classificação de baixo risco. “É um mecanismo, como todos os outros do mercado de capitais, muito mais seletivo”, explicou um assessor. “De qualquer maneira, será um instrumento muito importante de suporte ao financiamento das empresas.”

O governo está otimista com a volta do mercado à normalidade. Indício disso é o crescimento da oferta de crédito nos últimos meses – o estoque atingiu 45,9% do PIB em outubro, face a 39,5% do PIB no mesmo mês do ano passado – e o aumento da competição entre os grandes bancos. Técnicos do governo mencionam a oferta inicial de ações (IPO) feita pelo banco Santander como um marco desse novo momento.

Os competidores, observa uma fonte, estão se movimentando para enfrentar a concorrência. Os ganhadores serão os tomadores de crédito. Para ajudar nesse processo, o governo anunciou, também na quarta-feira, a decisão de autorizar os bancos a emitirem letras financeiras, um novo instrumento destinado a aumentar suas fontes de financiamento.

Ontem, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, confirmou, em entrevista, que o BNDES vai sair das linhas de capital de giro. “Investimento não é algo só para um ano. É para vários anos”, afirmou.