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Genética

Milho reforça "inclinação" gaúcha para transgênicos

<p>Agricultura do Rio Grande do Sul não oferece estrutura para milho transgênico.</p>

A julgar pela experiência do Rio Grande do Sul com a soja transgênica e pelas previsões de representantes de cooperativas, empresas, entidades de classe e governo, a segregação do milho geneticamente modificado que começou a ser plantado agora no Estado é uma hipótese praticamente nula.

Além da possibilidade de contaminação das plantações convencionais pela polinização cruzada, a avaliação é que o Estado não dispõe de estrutura logística adequada, que o Ministério da Agricultura terá dificuldades para fiscalizar o respeito às normas de biossegurança e que o mercado não está disposto a pagar o preço da separação dos grãos desde a colheita, transporte e armazenagem até a industrialização.

O fato de o milho ser mais utilizado diretamente na alimentação humana do que a soja não altera a situação, e a tendência é que os grãos convencionais e transgênicos serão mesmo comercializados juntos. “No momento não há estrutura para segregar”, afirma o diretor da corretora Brasoja, Antônio Sartori.

Conforme o coordenador técnico da cooperativa Cotrijal, de Não-Me-Toque, Robson Sandri, se houver algum nicho de mercado baseado no “apelo” do grão convencional para consumo humano a separação pode ser feita, mas os consumidores terão que arcar com os custos. Sandri não soube calcular o tamanho desse gasto extra.

“A segregação é possível, mas exige investimentos razoáveis”, reforça o diretor executivo do Sindicato Nacional da Indústria de Alimentação Animal (Sindirações), Ariovaldo Zanni. De acordo com ele, não há notícia de que no segmento alguém esteja disposto a pagar esse preço. Boa parte do farelo de soja, que compõe cerca de 20% da alimentação de aves e suínos, já é produzida a partir de grãos transgênicos no país e o varejo não registra restrições dos consumidores de carnes, o que permite supor que a reação não será diferente com o milho, que representa entre 65% e 70% das rações, de acordo com o executivo.

Zanni acredita, ainda, que a produção de milho geneticamente modificado será a saída para suportar o crescimento da demanda por rações graças ao esperado aumento da produtividade das lavouras. “Caso contrário, pelas nossas projeções, o Brasil precisará importar o grão em dez a 12 anos”, explica ele.

Para 2009, a previsão da entidade é de uma produção de 49,7 milhões de toneladas do produto destinado à alimentação de aves e suínos, 4,2% a mais do que em 2008, enquanto a Companhia Nacional do Abastecimento (Conab) projeta uma retração de 12,4% na safra de milho no ciclo 2008/09 em relação à colheita anterior, para 51,4 milhões de toneladas.

O diretor-executivo do Sindicato das Indústrias de Produtos Suínos do Rio Grande do Sul (Sips), Rogério Kerber, endossa a avaliação de Zanni. “No mercado de carnes não existe esta restrição [à alimentação dos animais com grãos transgênicos]. Evidentemente pode se abrir algum nicho de mercado, com algum pedido especial”. Ele lembra que os principais exportadores mundiais de milho, EUA e Argentina, são produtores de longa data de grãos geneticamente modificados e enfrentam pouca ou nenhuma resistência por isso.

Adepta do uso das novas tecnologias no campo, a Cotrijal prevê que o milho resistente à lagarta (Bt) desenvolvido pela Monsanto já irá ocupar entre 60% e 70% da área destinada à cultura na sua área de atuação na próxima safra (2009/10). Em 2008/09, apenas 150 dos 40 mil hectares foram semeados com a semente modificada para testes, diz o coordenador técnico da cooperativa. Conforme Sandri, a possibilidade de evitar o ataque das lagartas com menos herbicida deve atrair a maioria dos quase 4 mil produtores associados, até porque muitos deles tiveram perdas de produtividade de até 13% por conta desse tipo de praga na temporada passada.

Em março, o produtor João Domingos, do município de Jóia, fez a primeira colheita oficial de milho Bt do país. Foram 3,5 hectares cultivados com híbridos transgênicos, mas o ganho de produtividade de até 9% e a redução de custos em 4% ante as variedades convencionais animaram o agricultor a decidir pelo plantio de 90% de seus 540 hectares com sementes modificadas no ciclo 2009/10.

De acordo com Sandri, da Cotrijal, os grãos transgênicos só não devem ocupar 100% da área porque é recomendada a manutenção de uma zona de refúgio de 10% onde os insetos que adquirirem resistência à toxina presente no milho Bt possam se reproduzir com espécies suscetíveis para gerar descendentes também suscetíveis.

Para o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a ausência de estrutura e de disposição para a segregação dos grãos no Brasil é “extremamente grave”. “O quadro pessimista equivale a dizer que os produtores e consumidores não terão alternativa”, afirma a advogada da instituição, Andréa Lazzarini Salazar. Segundo ela, o país já falha na aplicação das regras de rotulagem, que exigem a identificação de qualquer produto com mais de 1% de componentes modificados, e o Ministério da Agricultura não pode se “omitir” na fiscalização do milho transgênico.

Segundo Andréa, as normas de coexistência definidas pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), que estabelecem a distância de 100 metros entre lavouras de milho convencional e modificado ou uma “bordadura” de 20 metros entre ambas preenchida por plantas não-transgênicas, foram questionadas por cientistas. O Idec considera o caso do milho mais grave do que o da soja transgênica devido ao risco de contaminação entre as plantações e seus potenciais efeitos sobre o ambiente. Em 2007 a instituição ingressou com uma ação civil pública, que ainda tramita na Vara Ambiental de Curitiba, contra o parecer que liberou a variedade Liberty Link, Bayer CropScience, devido, entre outras razões, à “falta de transparência” do processo de aprovação.