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Bem-estar animal e valor agregado

<p>Nos supermercados, alguns produtos trazem selos que garantem o bem estar do animal que deu origem àquele determinado produto.</p>

Redação (13/11/2008)- Uma galinha poedeira (que bota ovos) tem aproximadamente 18 meses de vida (1,5 ano). Nesse período, vive em uma gaiola do tamanho de uma folha de papel ofício, quase não se movimenta e nem convive com seus iguais. Em alguns países do mundo, sobretudo nos da União Européia, os consumidores estão preocupados com essas condições.

Nos supermercados, alguns produtos trazem selos que garantem o bem estar do animal que deu origem àquele determinado produto. Ontem, o governo brasileiro inseriu o País oficialmente nesta discussão. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) lançou – via Instrução Normativa nº 56 – recomendações sobre práticas de trato de animais que funcionam, por enquanto, como orientação aos criadores e indústrias. "Por enquanto, não há obrigatoriedade em adoção. O que estamos fazendo agora é fomentar uma rede de pesquisa para estudar quais as condições de bem estar animal que se encaixa ao sistema produtivo brasileiro", afirma a chefe da divisão de bovideocultura do Mapa, Andrea Parrilla.

Estamos falando das cinco liberdades, explica Antônio Augusto Silva, diretor da Sociedade Mundial de Proteção Animal (WSPA) no Brasil. "Livre de fome, de estresse, de sede, de doenças e com liberdade de manifestação natural", arremata Silva. A normativa ainda não traz pontos específicos a serem adotados, como por exemplo, espaçamento ideal entre animais confinados. "Isso deve ser feito mais adiante, com a publicação de manuais por espécies", avisa Andrea.

Mas, o próprio setor produtivo do Brasil já está avançando nesta questão. Na suinocultura, a maioria dos frigoríficos localizados na região produtora do centro-oeste de Santa Catarina possui equipes treinadas para o manejo dos animais. "Há pessoas que ainda não acreditam que os animais sentem dor, por isso os chutam, empurram, dão pancadas. Hoje isso é crime e o produtor ou tratador fica sujeito às penalidades da lei", diz o pesquisador da área de suínos da Embrapa Suínos e Aves, de Concórdia (SC), Osmar Dalla Costa.

Segundo ele, a ausência de bem-estar também leva à produção de carne de qualidade inferior e resulta em perda de vendas. A orientação da Embrapa é de que o sistema de produção seja adequado desde o alojamento de matrizes. "O animal não pode ser castrado. Em vez disso, 60 dias antes do abate faz-se a imunocastração por meio de vacina que provoca o encolhimento dos testículos", detalha. Todas as demais etapas, da alimentação, higiene, limpeza e abate, seguem regras rígidas para evitar estresse ou ferimento do animal.

O chamado abate humanitário é feito com pessoal qualificado e treinado. Consiste em um período prévio de jejum de cerca de 12 horas e o transporte é feito respeitando a densidade de até 230 quilos de suíno por metro quadrado. Ao chegar na propriedade para carregar os animais, o caminhão deve ter sido previamente higienizado e desinfetado, evitando assim a contaminação. Ao chegar ao frigorífico, o animal deverá descansar de três a cinco horas e depois passar por um processo de atordoamento, ajustado pelo peso e tamanho, quando perderá os sentidos. Só então é realizada a sangria.

Dalla Costa diz que os maus tratos provocam perdas dos índices de produtividade, que se refletem no número de leitões nascidos vivos, terminados, em redução de ganho de peso e gastos com medicamentos; e dos índices de qualidade. Neste caso, a carne apresenta problemas como de incidência de PSE (pale, soft, exudative – carne pálida, mole, exudativa) e DFD (dark, firm, dry – escura, dura, seca) nas carcaças. Dalla Costa afirma que se o animal apresentar lesão ou hematoma, parte da carcaça precisa ser retirada e descartada.

Mas ainda há muito o que avançar na atividade. Um ponto polêmico é o das gaiolas de gestação das porcas (matrizes reprodutoras). "As porcas ficam numa gaiola apertada praticamente a vida inteira (que pode durar de cinco a oito anos). Ela dá uma cria atrás da outra, não consegue se mexer, a não ser levantar e deitar na mesma posição. Essa prática é considerada cruel", exemplifica Silva, da WSPA.

Mas o conceito de bem-estar animal é um pouco controverso, na avaliação de Rubens Valentini, presidente da Associação Brasileira dos Criadores de Suínos (ABCS). No caso pontual das gaiolas de gestação, ele pondera que manter um espaço coletivo para gestação, ou seja, manter várias porcas juntas, pode trazer também estresse. "É comum, as matrizes se morderem, se empurrarem e dar cabeçadas no ventre da outra. Isso machuca, estressa e traz perdas de filhotes. Isso é conforto e bem-estar? Ficar presa, isolada, também não é. Na realidade, é difícil avaliar as duas situações", pondera Valentini.

Ele afirma também que os investimentos para deixar o sistema tradicional de gestação são altos. "Para permitir que a porca possa dar um giro em torno de si mesma, teríamos que usar o espaço de três gaiolas para construir uma. Essa estrutura é coberta. Demandaria muito capital", acrescenta.

Avicultura: No caso da avicultura, além do espaço reduzido para as galinhas poedeiras, também é considerado prática abominável a desbicagem do animal, segundo Silva, da WSPA. "Cortam o bico das galinhas porque em ambiente pequeno elas se estressam e começam a se bicar" completa Silva.

O pesquisador da área de aves da Embrapa Suínos e Aves, Paulo Sérgio Rosa, explica que os animais devem ser livres para expressar seus comportamentos normais. Hoje grande parte dos aviários é fechado e climatizado porque o alojamento de grande número de frangos (chega até 36 quilos/m2) gera intenso calor. "Este sistema pode também ocasionar problemas quando há falta de energia elétrica. Por isso orientamos os produtores a instalarem geradores a diesel para evitar a mortalidade", diz.

O pesquisador afirma que até o ato de pegar o frango indelicadamente pode ocasionar lesões ou arranhões na pele ou fraturas nas asas ou pés. "A maneira correta de pegar um frango é pelo dorso". Rosa explica que o abate humanitário das aves segue mais ou menos as mesmas regras da suinocultura. O processo inicia com a restrição alimentar de oito a 12 horas para evitar a presença do alimento no papo, ou no restante do intestino, que pode resultar em contaminação. Um jejum muito longo, de 18 horas a 20 horas, segundo Rosa, não é adequado, já que o intestino pode se romper, além de causar estresse. Os animais são, então, colocados cuidadosamente em caixas próprias para o transporte, com densidade de 22 a 25 quilos de animais por caixa.

Europa- Em janeiro do ano que vem será realizada a Conferência Global sobre Comércio e Bem-estar Animal irá reunir agricultores, comerciantes, políticos, acadêmicos, instituições internacionais e organizações de proteção dos animais para apresentar experiências positivas de inclusão do bem-estar animal no mercado mundial. Saiba mais clicando aqui.