Redação (24/07/07) – Comemorado pelo governo como um dos principais instrumentos de incentivo ao setor rural, o aumento na oferta de crédito rural não tem cumprido o papel de alavancar os negócios agropecuários e estimular investimentos na área.
Na temporada 2006/07, finalizada em 30 de junho, a aplicação dos recursos chegou a apenas 89% do total programado – no ciclo anterior (2005/06), o desembolso chegou a 95% do total. Com isso, "sobraram" R$ 5,387 bilhões no sistema financeiro. O governo tinha anunciado R$ 50 bilhões para o setor, mas foram efetivamente aplicados apenas R$ 44,613 bilhões, segundo dados obtidos pelo Valor. No ano-safra 2005/06, havia R$ 44,35 bilhões, e os desembolsos somaram R$ 42,345 bilhões – um déficit da ordem de R$ 2 bilhões.
A crise de renda no segmento de grãos e o conseqüente crescimento do endividamento rural ajudam a explicar a piora neste indicador de desempenho do setor, sobretudo no crédito para programas de investimentos. Mas a política de concessão de crédito dos bancos também tem sido cada vez mais restritiva. "Há um temor com a crise e uma avaliação caso a caso sobre a situação financeira de cada produtor", afirma o coordenador-geral de Análise Econômica da Secretaria de Política Agrícola do ministério, Marcelo Guimarães. "Os bancos contraíram o crédito e ficaram mais criteriosos", observa ele.
Da análise do desempenho do crédito rural na última safra emergem evidências de uma forte desaceleração no crédito para investimento. Os oito programas administrados pelo BNDES deixaram de aplicar R$ 3,2 bilhões (53%). Neste período, o desembolso foi ainda menor do que na temporada anterior (queda de 12%), quando foram emprestados R$ 3,3 bilhões. "É a demonstração da crise. Houve uma impossibilidade de acessar os recursos. Não há capacidade de endividamento", analisa a vice-presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA), senadora Kátia Abreu (DEM-TO).
"E vai piorar nesta safra atual porque os bancos vão restringir ainda mais o crédito, já que os produtores não têm garantias reais para os empréstimos", diz ela.
Os dados oficiais, consolidados pelo Ministério da Agricultura, evidenciam que os produtores também deixaram de ter acesso aos recursos do crédito de custeio com juros livres. Escaldado com as altas taxas, o setor contratou apenas 88% do total disponível. Na safra anterior, os produtores haviam tomado emprestado 14% a mais do que o previsto. Assessor técnico da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), o economista Ademiro Vian avalia que as restrições bancárias têm fundamentos sólido.
Segundo ele, houve uma oferta adicional de crédito em razão da "sobra" de R$ 1,2 bilhão ocorrida em 2005/06, a elevação no volume das exigibilidades bancárias provocadas pela explosão dos depósitos à vista e a necessidade de maior seletividade na concessão do crédito. "As restrições cadastrais inibiram o crédito. Isso vai continuar talvez com mais rigor porque vamos ter que fazer provisão para riscos operacionais a partir de dezembro".
Ainda conforme Vian , o governo precisa mudar a matriz do crédito, passando a analisar as cadeias produtivas e criando um estatuto de micro e pequenos empresas do agronegócio. "Pessoa física tem pouco espaço no mundo do crédito de hoje".
Os números do Ministério da Agricultura mostram, também, ter havido um piora até mesmo nos empréstimos de custeio e comercialização da safra. O desembolso efetivo despencou de 111% na temporada 2005/06 para 95% no período terminado em junho deste ano. Sobraram R$ 1,878 bilhão nessa rubrica. "Os produtores tomaram menos recursos, mas houve melhora no perfil com juros mais baratos", argumenta Marcelo Guimarães. Segundo ele, nesta safra a situação deve ser normalizada. "Está havendo uma retomada com queda dos juros e solução parcial para as dívidas do setor".