A recessão econômica iminente na Argentina será mais grave do que inicialmente prevista, uma vez que está sendo afetada por uma das piores secas registradas na memória recente, que vem devastando as exportações agrícolas cruciais.
O Produto Interno Bruto (PIB) da segunda maior economia da América do Sul – que precisa desesperadamente de dólares – deve contrair 3% em 2023, bem abaixo da previsão anterior de retração de 1,5%, de acordo com as novas projeções do Itaú Unibanco Holding e da firma de consultoria EconViews, de Buenos Aires. “Está realmente ruim”, diz Andrés Borenstein, economista-chefe da EconViews.
“A disponibilidade de dólares ficará bem restrita”. Na quarta-feira, a Bolsa de Comércio de Rosário reduziu a estimativa de produção de soja em mais 22% e alertou para a possibilidade de mais cortes nas projeções. A nova estimativa, de 27 milhões de toneladas, se confirmada, será a menor colheita em 15 anos.
As plantações de soja e milho localizadas no cinturão agrícola dos Pampas estão em fases de crescimento, que determinam o rendimento futuro e demandam maior necessidade de água. Infelizmente, não estão tendo trégua para a seca, agravada por ondas de calor intensas.
“A Argentina sofre um cenário climático sem precedentes na história da agricultura moderna”, escrevem analistas da Bolsa de Comércio de Rosário, liderados por Cristian Russo. “Não há nenhum evento climático no horizonte que nos permita colocar um piso para os rendimentos ou para a área que simplesmente não terá colheita.”
A Argentina é o maior fornecedor mundial de farelo de soja para ração animal e de óleo de soja para uso em cozinha e na produção de biocombustíveis, e o terceiro maior fornecedor de milho. O país depende dessas receitas das exportações, que em anos normais chegam a dezenas de bilhões de dólares, para reforçar as reservas internacionais, num momento em que encontra dificuldade para cumprir as metas do programa de US$ 44 bilhões do país com o Fundo Monetário Internacional (FMI).
A safra do segundo trimestre também costuma ser um grande motor para a economia, que já enfrentava dificuldades em outros setores e ruma para uma recessão. Na quarta-feira, o governo até permitiu aos exportadores prorrogar as datas acordadas nos embarques de milho para ajudá-los a cumprir os compromissos com compradores internacionais e garantir que haja ração no mercado interno para as aves e o gado.
A seca se estende há tanto tempo que produz desastres sucessivos – uma colheita ressecada de trigo em 2022 e agora as exauridas colheitas de soja e milho. O quadro alimenta temores de que muitos agricultores não consigam salvar o ciclo de investimento das safras e acabem falindo. O efeito dominó se disseminará pela economia, segundo Borenstein.
Haverá menos transporte rodoviário e marítimo, por exemplo, o que reduzirá as receitas de pedágios nas estradas e rios e prejudicará as empresas ao longo dessas importantes vias de escoamento.
Por sua vez, a falta de dólares agrícolas fluindo para os cofres do banco central poderá afetar o volume de importações que o governo autoriza para outros setores além do agrícola, acrescentou. “O problema está na economia real”, disse Borenstein. “Muitas pessoas nos setores de indústria ou construção ficarão sem insumos como resultado da seca.”