Uma pesquisa publicada na última edição da revista “Infection, Genetics and Evolution” revela a presença de um subtipo mais invasivo e mais patogênico de salmonela no Brasil. Até hoje, o ST313, como é chamado, havia sido registrado quase exclusivamente na África Subsaariana.
Ao contrário de outros subtipos de Salmonella enterica sorovariedade Typhimirium, que provocam gastroenterite, com febre, náuseas, vômito e diarreia, essa variação da bactéria consegue quebrar a barreira gastrointestinal e cair na corrente sanguínea, provocando infecção. Estudos anteriores com pacientes africanos apontam que a taxa de mortalidade com o ST313 é de mais de 25%.
“Esse achado é filogeneticamente importante e extremamente interressante, porém muito preocupante em termos de saúde pública”, avalia Cristiano Gallina Moreira, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Araraquara (FCF-Unesp) e um dos autores do estudo, uma parceria entre cientistas da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), do Instituto Adolfo Lutz de Ribeirão Preto, da Fundação Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz) e do Food and Drug Administration, dos Estados Unidos.
Circulação silenciosa
O artigo publicado, intitulado “Multilocus Sequence Typing of Salmonella Typhimurium reveals the presence of the highly invasive ST313 in Brazil”, aponta a presença do ST313 em nove das 88 amostras analisadas.
Foram estudadas amostras isoladas entre 1983 e 2013, provenientes de São Paulo, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul, Goiás, Paraná e Bahia, e todas com a presença do ST313 são de São Paulo. A primeira unidade com o subtipo data de 1989. Também há registros de 1990, 1993, 1995, 1996, 1998, 2000 e 2003, retirados de fezes humanas, salsicha de porco crua, alface e sangue.
“Se considerarmos a amostra isolada no ano 2000, por exemplo, são 17 anos até sua identificação e descrição científica”, diz Cristiano sobre a demora para identificar o subtipo no país, problema que para o grupo pode estar relacionado à não obrigatoriedade de notificação de casos de Salmonella no Brasil.
Atualmente, episódios isolados não precisam ser comunicados, apenas surtos alimentares. Por conta disso, há poucos dados disponíveis para análise e o acesso a eles é difícil. “Muitos casos esporádicos, infelizmente, passam despercebidos, sem sua devida identificação”, alerta o pesquisador.
Outro problema da falta de notificação, segundo os pesquisadores, é o uso indiscriminado de antibióticos de amplo espectro contra diferentes linhagens bacterianas. Durante um período a medicação funciona, mas, com o passar do tempo, os organismos unicelularesse tornam resistentes e o remédio pode deixar de surtir efeito. Nesse cenário, a situação sai do controle antes que os centros de pesquisa consigam concluir de que forma a bactéria atua especificamente.