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Economia

Queda na conta de luz não aumentou consumo de energia

Demanda na indústria, comércio e entre usuários domésticos seguiu média histórica.

Queda na conta de luz não aumentou consumo de energia

Quando a presidente Dilma Rousseff foi à TV, um ano atrás, para anunciar que a conta de luz em todo o país cairia entre 20% e 32%, a medida foi comemorada por usuários residenciais, comerciais e industriais. As críticas, no entanto, não demorariam a surgir, baseadas na acusação de que o governo, em tom populista, incentivava o consumo de energia, justamente no momento em que o país enfrentava uma forte seca e queda drástica no nível dos reservatórios das hidrelétricas, como ocorre hoje, levando ao acionamento constante das usinas térmicas, muito mais caras e poluentes que aquelas movidas a água.

O governo passou a ser criticado por jogar gasolina na fogueira, reduzindo a conta de luz ‘na marra’, enquanto o país enfrentava problemas graves para garantir o abastecimento de energia. Essa tese, porém, não se confirma na prática.

O Valor fez um levantamento de dados históricos de consumo de energia divulgados pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE). A partir daí, confrontou esses dados com indicadores macroeconômicos compilados pelo Valor Data, incluindo a evolução do PIB, inflação, crescimento industrial e crescimento de vendas do varejo. O objetivo foi verificar o comportamento do mercado e do setor elétrico antes e depois da redução efetivada em janeiro do ano passado. O cenário mostra que a queda na conta de luz não elevou o consumo de energia no país.

Entre janeiro e dezembro de 2013, o consumo total de energia no Brasil teve crescimento de 3,5%, exatamente a mesma taxa verificada em 2012, e até inferior aos 4,2% do crescimento registrado em 2011. A análise desse cenário torna-se mais precisa, se observada a evolução de consumo de energia em cada mercado, individualmente. A indústria, que amargou um 2012 negativo e teve um avanço pífio no ano passado, refletiu o mesmo desempenho em demanda do setor elétrico, com avanço no consumo de apenas 0,6% no ano passado, contra um recuo de 0,1% no ano anterior.

Até o varejo, que vinha registrando forte crescimento até 2012, com alta de 7,8% no consumo de energia naquele ano, teve uma expansão mais fraca (5,7%) no ano passado.

Um salto de consumo foi registrado, de fato, pelo consumidor residencial. A população, que demandou 5,1% mais energia em 2012, registrou alta de 6,1% no ano passado. Esse crescimento, porém, está longe de ser atribuído à ideia de que, com a queda de preço, as pessoas passaram a ficar mais tempo no banho. O crescimento no setor se explica, em grande parte, pelo número de novos usuários conectados à rede elétrica do país.

Em 2013, o número de consumidores residenciais ligados ao setor elétrico subiu 3,4% sobre o ano anterior, superando crescimento de 2,9% verificado em 2012. Entre janeiro e dezembro do ano passado, mais de 2 milhões de casas passaram a receber conta de luz, um índice que se deve, em boa parte, às novas ligações realizadas pelo programa Luz Para Todos.

O presidente da EPE, Maurício Tolmasquim, comentou o cenário: “O que se vê é que, pelo menos entre os usuários residenciais e comerciais, a energia não é tão elástica, ou seja, a variação de preço não significou uma variação forte de consumo. São mercados muito mais sensíveis ao calor que ao preço”, disse. “Fica claro que a redução da conta de luz é um benefício, mas não um fator decisivo para aumento de consumo.”

O que está jogando hoje o consumo de energia para cima, diz o presidente da EPE, é a combinação da situação climática com o aumento de consumo nas classes C e D, que turbinaram a compra de itens como ar-condicionado. “O chuveiro elétrico continua a ser a principal fonte de consumo, mas é preciso lembrar que ele fica ligado 15, 30 minutos. Já o ar-condicionado fica ligado praticamente o tempo todo. Certamente isso tem um impacto”, disse.

O consumo de energia por ano no Brasil, disse o secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, é de 2.400 kilowatts-hora (kWh) per capita, enquanto na Europa a média está entre 6 mil e 12 mil kWh por cada cidadão. Um país em desenvolvimento, como a África do Sul, por exemplo, consome 4.700 kilowatts-hora per capita.

“A verdade é que estávamos com os preços de energia elétrica num patamar que nos deixava entre as tarifas mais altas do mundo. Entramos num patamar de média mundial”, disse Zimmermann. “Essa famosa redução, que tanto se critica, trouxe o Brasil para um patamar que, embora ainda alto, está mais baixo que antes.”

A queda na conta de luz foi viabilizada por meio do conturbado processo de renovação dos contratos de concessões do setor elétrico. As quedas na conta de luz vieram, principalmente para consumidores residenciais e comerciais. A questão atual, no entanto, é saber até quando essa situação resistirá, já que o acerto de contas das indenizações com concessionárias e o uso ininterrupto da geração térmica têm obrigado o Tesouro a bancar as contas bilionárias que sangram o setor desde o ano passado.