O fraco resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre deste ano reforçou a percepção de que o crescimento médio da economia nos primeiros dois anos do governo Dilma Rousseff ficará abaixo de 2%, inferior à expansão de 4,5% observada anualmente entre 2004 a 2010. O PIB do terceiro trimestre cresceu apenas 0,6% em relação ao segundo trimestre, feitos os ajustes sazonais. Em quatro trimestres, após encerrar 2011 com 2,7% de alta, o PIB cresceu 0,9%.
Em parte, a desaceleração é causada por fatores conjunturais, principalmente o baixo crescimento global em função da crise que atinge as principais economias desenvolvidas do mundo, mas fatores estruturais também pesaram na queda, segundo economistas ouvidos pelo Valor.
Para esses analistas, o PIB potencial do Brasil estaria hoje entre 3% e 3,5%, com poucas chances de chegar a 4%. Esse indicador – que em tese representa a capacidade de crescimento do país sem gerar inflação – seria hoje menor por causa do desemprego na mínima histórica, da baixa taxa de investimento e de poupança, além da ausência de reformas regulatórias que elevem a produtividade da economia.
José Carlos de Faria, economista-chefe do Deutsche Bank, afirma que na fase anterior à crise, entre 2004 e 2008, o Brasil se beneficiou do período de bonança global, com crédito farto e forte crescimento chinês, o que favoreceu preços de commodities e, por consequência, os exportadores de matérias-primas. como o Brasil. “É muito difícil que tenhamos outro período com situação tão favorável para os exportadores de commodities, então precisamos nos preparar para uma conjuntura externa bem menos benigna”.
O mercado de trabalho, que também favoreceu o mais recente ciclo de expansão, irá contribuir muito menos com a capacidade produtiva do país nos próximos anos, segundo Faria. Em uma década, a taxa de desemprego saiu de 12,5% para 5,5% neste ano. A evolução da oferta de mão de obra é uma das três grandes variáveis que costumam ser levadas em conta nas estimativas para o PIB potencial, ao lado do estoque de capital e da produtividade.
Daqui para frente, diz o economista do Deutsche, a oferta de trabalhadores irá depender do crescimento da população, que apresenta tendência de queda em função da redução da taxa de fertilidade nos últimos 40 anos. Segundo estimativas das Nações Unidas, a expansão da força de trabalho no Brasil irá recuar de 1,3% ao ano, hoje, para cerca de 0,3% em 2025.
Sem o rali das cotações dos principais produtos da pauta de exportações brasileira e com o mercado de trabalho bastante apertado, diz Faria, será preciso elevar o investimento ou aumentar a produtividade para que a economia possa manter o mesmo ritmo de avanço da década passada. Hoje, ele estima que o PIB potencial é de 3,5%.
O problema é que cresce entre economistas a percepção de que o investimento não será retomado, apesar dos estímulos, por causa do aumento da interferência do governo na economia. “Alguns episódios, como a renovação das concessões das geradoras de energia elétrica, aumentaram o temor em relação ao ambiente institucional, e é possível que isso esteja influenciando negativamente as decisões de investimento”, afirma Faria.
Para José Márcio Camargo, economista da Opus Investimentos, a recorrência das intervenções do governo causam desconforto e pioram o ambiente regulatório. Para ele, falta também transparência na condução da política econômica. Diante do conturbado cenário externo, diz, não seria um problema flexibilizar o tripé macroeconômico, formado por metas de inflação, câmbio flutuante e superávit primário. No entanto, diz, é baixa a previsibilidade dos próximos passos da equipe econômica.
“Como não se sabe se o câmbio é fixo ou flutuante, as empresas não sabem se aumentam endividamento em dólar, por exemplo, e preferem esperar para ver o que vai acontecer”, diz Camargo, para quem o potencial da economia está mais próximo de 3%.
A desconfiança gerada no setor privado, avalia Fernando Rocha, sócio da JGP, gera ansiedade, e por isso o setor privado não retoma os projetos de investimento, apesar dos estímulos em curso. Embora veja alguns retrocessos, como a interferência na política de preços da gasolina e o impacto sobre a Petrobras, por exemplo, Rocha afirma que o governo recentemente mudou o diagnóstico e passou a ver que é preciso estimular a oferta, e não apenas a demanda. Assim, as concessões de projetos de infraestrutura e as medidas para reduzir os custos da indústria, como a desoneração da folha, são passos na direção correta, afirma.
São medidas que podem elevar a produtividade da economia, embora seu efeito ainda seja incerto, na avaliação de Bráulio Borges, economista-chefe da LCA Consultores, que estima PIB potencial de 3,8%. O crescimento mais baixo nos últimos dois anos, afirma, não caracteriza perda de capacidade de avanço da economia, porque é explicada, em parte, pelo comportamento cíclico da produtividade.
“Sempre que há desaceleração da economia, a produtividade cai, porque os empresários evitam demitir. Nos momentos de retomada, a produtividade sobe muito, porque o empresário, antes de contratar, usa horas extras”. No longo prazo, nos cálculos da LCA, a produtividade total dos fatores tem crescido 1,3%, ou 1,4%, ao ano.
Para Faria, do Deutsche, essa variação tende a ser menor, de 1% ao ano. Estimativa do banco mostra que, se o país não conseguir aumentar a eficiência, mesmo que o investimento alcance 23% do PIB em uma década, o potencial recuaria de 3,9% neste ano para 3,5% em 2022 por causa da desaceleração do crescimento da oferta de mão de obra.
Essa hipótese, diz Faria, pode se mostrar pessimista, caso o governo consiga avançar em reformas, que perderam momento nos últimos anos. O economista acredita que, com o debate mais acirrado em torno do crescimento nos últimos meses, é possível que aumente a demanda da sociedade por avanços que promovam a eficiência produtiva do país.
Um dos pontos que poderiam avançar, afirma Rocha, da JGP, é o cadastro positivo. O fato de os bancos terem acesso ao histórico de crédito do indivíduo poderia contribuir para reduzir mais rapidamente os juros cobrados dos consumidores. “São medidas pequenas, pontuais, mas importantes.”