Rejeitada em parte pela bancada ruralista e quase totalmente por deputados ambientalistas, a proposta de alteração do Código Florestal Brasileiro ganhou fôlego no jogo de bastidores. De forma reservada, os ruralistas costuram um novo texto para complementar e ajustar o polêmico relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP).
Os ruralistas abriram um canal direto de negociação com a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira. E têm aval do Palácio do Planalto e dos principais líderes partidários da Câmara, boa parte deles com origem no campo. Sob orientação da presidente Dilma Rousseff, as conversas evoluíram, alguns consensos surgiram e um texto “conciliatório” deve ser apresentado na “comissão de entendimento” criada pelo presidente da Câmara, Marco Maia (PT). A comissão deve sugerir as mudanças até abril.
O objetivo da convergência política é garantir a votação do novo Código Florestal, em vigor desde 1965, no plenário da Câmara em abril. Para isso, haveria concessões a ambos os lados. As principais alterações, ainda sob avaliação, seriam restringir a compensação ambiental em áreas dentro do mesmo Estado onde ocorreu a derrubada da vegetação original. A “anistia” aos desmatadores teria uma data de corte menos ampla, podendo ser 2001, quando foi editada a medida provisória que alterou a Área de Proteção Permanente (APP). Quem desmatou até essa data, teria tratamento diferenciado dos demais. Assim, as áreas consolidadas seriam garantidas e a lei não retroagiria para punir ninguém.
Nas negociações entre ruralistas e o governo, estão as APPs em margens de rios. Essas áreas poderiam voltar a ter um mínimo de 30 metros ao invés dos 15 metros previstos no relatório Aldo Rebelo. E as APPs teriam que ser recompostas. O governo ofereceria linhas de crédito a juros baixíssimos para garantir essa obrigação. Alguns topos de morro podem voltar a ter proteção total a desmatamentos.
Até aqui, porém, perdura o embate em um tema central: as áreas de reserva legal (RLs). O Meio Ambiente aceita a soma das RLs com as APPs. Também topa dispensar a recomposição de RLs até os 80% previstos na atual legislação na Amazônia. Esse índice poderia ficar em 50% das áreas. Além disso, ficaria dispensada essa recomposição em municípios onde mais da metade do território for coberto por unidades de conservação (UCs).
Mas o Meio Ambiente não aceita, de forma nenhuma, a isenção de RLs em áreas até quatro módulos rurais (de 20 a 100 hectares). Os ruralistas também são irredutíveis em mexer nesse item. Eis aí um tema que pode ser levado a voto no plenário da Câmara. Outro ponto de divergência é a concessão de poder de legislar sobre o assunto aos Estados. Isso também deve ser objeto de votação.
Mas uma outra proposta une a ala ambiental do governo aos interesses ruralistas: o pagamento por serviços ambientais a quem mantiver as áreas verdes preservadas. Mas o governo quer o mecanismo para incentivar a manutenção das áreas, e não como indenização aos proprietários rurais.
Os ruralistas contam, ainda, com um forte apoio das lideranças partidárias da Câmara. Vários líderes têm militância ruralista. No PSDB, Duarte Nogueira (SP) tem forte base rural eleitoral. O PDT é comandado pelo ruralista Giovani Queiroz (PA). E o PP tem o deputado Nelson Meurer (PR) como líder da bancada. “É um fato inédito e temos que aproveitar o momento político”, disse o deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR). O líder do seu partido, Henrique Alves (PMDB-RN), também declarou apoio às teses ruralistas. Mas como terá eleições para a Presidência da Câmara em 2013, Alves pode tentar uma posição de “equidistância”. O goiano Jovair Arantes (PTB) e o mineiro Lincoln Portela (PR) também fecharam questão com os ruralistas.
Em audiência com a bancada do PDT na Câmara, o relator Aldo Rebelo afirmou que há espaço para negociações com o Meio Ambiente. “Vamos fazer um esforço pelo consenso. Vamos negociar o que for possível e votar”, afirmou aos deputados cujo líder é o ruralista Giovani Queiroz (PA). Rebelo rejeitou a costura de um projeto de lei ou MP do governo. “Não acredito que o governo mande um projeto de lei ou uma medida provisória porque tem as portas abertas com o relator”, disse.
Em seminário em outra sala da Câmara, parlamentares e militantes ambientalistas criticaram a proposta de Aldo Rebelo e tentaram radicalizar na defesa do atual Código Florestal. “O Aldo fugiu do debate, ignorou a ciência para falar aos deputados do PDT”, acusou o diretor do Instituto O Direito por um Planeta Verde (IDPV), André Lima. O deputado Aldo Rebelo afirmou não ter sido convidado pelos ambientalistas para debater o tema. “Já demos muita trela para essa gente de ONGs”, rebateu.