Cresce a dependência do Brasil em relação à China na exportação de produtos básicos. No primeiro quadrimestre deste ano o país asiático comprou 29,14% do total de básicos vendidos pelo Brasil ao exterior. A fatia representa um avanço em relação aos 26,3% no mesmo período do ano passado.
A demanda por produtos como minério de ferro, soja e petróleo, combinada com a alta de preços desses itens, fez a China absorver US$ 9,65 bilhões em produtos básicos brasileiros no acumulado de janeiro a abril. A compra dos chineses praticamente empata com os US$ 9,68 bilhões em produtos básicos exportados no mesmo período aos Estados Unidos e a toda a União Europeia juntos.
Enquanto a participação da China aumentou em quase três pontos percentuais, a fatia americana na exportação brasileira de básicos caiu de 8,07% no primeiro quadrimestre do ano passado para 6,24% para o mesmo período deste ano. A participação das compras dos países da zona do euro caiu de 23,8% para 23%. Os dados são do Ministério do Desenvolvimento (MDIC).
Welber Barral, ex-secretário de comércio exterior e sócio da Barral M Jorge Consultores Associados, diz que a China, com sua forte demanda, aumentou a compra de produtos básicos e tornou-se a principal parceira de vários países fornecedores dessa classe de mercadorias. “O momento atual é de preços extremamente elevados e oferta relativamente reduzida. O Brasil está aproveitando isso”, diz. “A médio prazo, porém, há sérios riscos.”
Rogério Cezar de Souza, economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), lembra que o aumento de participação da China nos embarques brasileiros de básicos tem sido uma das grandes causas para a ampliação da fatia dessa classe de produtos nas exportações totais do Brasil.
No ano de 2000, a China comprou US$ 739,8 milhões em básicos do Brasil. O valor era pouco representativo dentro dos US$ 12,6 bilhões em básicos embarcados pelos brasileiros. No ano passado, os chineses compraram US$ 25,8 bilhões em básicos, o que representou 28,6% do total exportado pelo Brasil nessa classe de produtos. Nesse período de dez anos, a fatia dos básicos nas exportações brasileiras saltou de 22,8% para 44,6%.
“Não há problema nenhum em exportar básicos. O problema é só exportar básicos e para poucos destinos”, diz Barral. Para ele, dentro de dois ou três anos, o que considera “médio prazo”, pode haver mudanças nos patamares de preços dos básicos e o Brasil pode sofrer impacto no resultado de sua balança comercial, cujo superávit hoje é sustentado pela exportação de básicos.
“O efeito do preço no avanço dos básicos e da participação da China foi muito maior do que o do volume, principalmente nos últimos meses”, lembra Sílvio Campos Neto, economista da Tendências Consultoria.
O principal produto brasileiro exportado hoje – e também o principal comprado pela China – é o minério de ferro. No primeiro quadrimestre deste ano o Brasil exportou US$ 11,3 bilhões em minério de ferro, dos quais US$ 5,3 bilhões foram para a China. No mesmo período do ano passado a exportação brasileira do produto foi de US$ 5 bilhões, sendo 42% para os chineses.
A alta em termos de valor foi proporcionada principalmente por aumento de preço. Em abril, houve elevação de 129% na exportação de minério de ferro, na comparação com o mesmo mês do ano passado. No período o preço subiu 88% enquanto a quantidade, apenas 22%.
A soja em grão, outro produto fortemente exportado para a China, experimentou aumento de 42% no valor em abril, na comparação com o mesmo mês do ano passado. No período, o aumento de preço foi de 30% enquanto o de volume, 9%. Os dados são do MDIC.
Além do preço, a alta demanda da China explica a ampliação da fatia do país asiático na venda de básicos do Brasil no mercado internacional. Regiões como a União Europeia, também tradicional consumidora de básicos brasileiros, por outro lado, ainda estão com menor crescimento e têm perdido espaço, lembra Souza.
“Apesar de realmente existir uma demanda realmente forte da China, é bom lembrar que a alta de preços também tem um componente especulativo, resultado da alta liquidez no mercado internacional”, diz o economista-chefe do Iedi. Um arrefecimento de preços, analisa, não muda a alta demanda chinesa, mas pode reduzir o saldo da balança comercial brasileira e até gerar déficit.
O economista da Tendências acredita que o aumento da dependência do mercado chinês não é ideal do ponto de vista estratégico. O ponto positivo, ressalta, é que o país tem aproveitado a oportunidade, o que tem propiciado a manutenção de uma moeda nacional mais forte. “Isso tem possibilitado as importações, necessárias para atender a demanda interna forte e para proporcionar o crescimento da economia.”
Barral vê os efeitos benéficos atuais da exportação brasileira de básicos. Ele ressalta, porém, que o avanço da China pode fazer com que o país asiático use essa maior dependência como instrumento de negociação. “Isso aconteceu com a Argentina no ano passado com o óleo de soja”, diz Barral. Ele se refere ao embargo de sete meses feito pela China em relação ao óleo de soja argentino, que tem no país asiático o principal comprador. “Os chineses pararam de comprar e a Argentina teve que negociar em uma condição desvantajosa.” Para Barral, essa possibilidade hoje é mais distante em relação ao Brasil porque para alguns produtos importantes na pauta de exportação brasileira não há outros fornecedores que consigam suprir a demanda chinesa. “Mas isso pode mudar. Pode haver, por exemplo, aumento de produção agrícola de soja por terceiros países ou mesmo pela própria China, nos investimentos que tem sido feitos no continente africano, por exemplo.”