Mais de um bilhão de pessoas no mundo dependem diretamente dos animais para sobreviver. A estatística reforça a ideia do bem-estar animal como estratégia para o crescimento econômico e a saúde humana. No Brasil, esse é o foco de uma comissão técnica, formada pelo Ministério da Agricultura. O projeto em parceria com a Sociedade Mundial de Proteção Animal recomenda técnicas menos agressivas, assim como a capacitação dos profissionais da pecuária.
Em uma fazenda localizada em Charqueadas, no Rio Grande do Sul, muita coisa mudou. As 160 novilhas estão prenhas e precisam de cuidados especiais. Neste inverno, o campo nativo foi semeado com azevém para garantir uma boa pastagem durante os meses de frio. Já os funcionários, realizam cursos de capacitação.
“Fizemos um curso de manejo de bovinos de corte. Pegamos a área de pastagem e calculamos a quantidade de animal que se pode ter por hectare, de acordo com a altura da pastagem e o tempo. Então vamos verificar se dá para passar o inverno ou se vamos deixar só 30 dias pra calcular a lotação na área, sempre pensando no animal”, explica o funcionário André Felipe Vieira.
Os 500 terneiros que acabam de desmamar são alimentados com silagem de milho. Eles comem de manhã, ao meio-dia, e se ficar muito frio, recebem mais uma refeição à tarde. A suplementação ajuda no ganho de peso ideal. As ferramentas pontudas que eram usadas para tocar o rebanho foram abolidas e deram lugar a simpáticas bandeiras.
“Uma outra coisa também que foi eliminada foi a utilização de cachorros, a não ser a nível de invernada, mas na mangueira não se usa mais. Os animais poderiam ser classificados nos que caçam e os que são caçados. Os bovinos, como as ovelhas e outros animais, eles são de caça. Já os animais que são vítimas dos caçadores, eles tem os olhos localizados mais lateralmente na caixa craniana, então a visão deles é muito mais ampla e menos dirigida. Então o que nós fizemos aqui, após ouvir algumas palestras sobre bem-estar animal, nós fechamos os listões da mangueira, do corro e do brete porque com isso facilita o manejo dos animais”, relata o pecuarista Henrique Orlandi.
A técnica permite que o rebanho tenha a vista projetada para frente, escurecendo as laterais. Assim como a visão, a audição do gado é mais aguçada que a dos humanos. Por este motivo, os cachorros foram extintos das práticas. Assim, os latidos não estressam o gado.
Em junho de 2006, um importante documento foi criado para estabelecer critérios de proteção animal, em todo o mundo. É a Declaração Universal de Bem-estar Animal que define regras básicas de bem-estar, reconhecendo os animais como seres que tem sentimentos.
O animal deve ser livre de fome, de sede, de desconforto, dor, lesões ou doenças. Deve ainda poder expressar os comportamentos normais e ser isento de medo e aflição. A comissão interna criada pelo Ministério da Agricultura vai coordenar as ações de bem-estar praticadas no país. Para isso, cada superintendência estadual terá um foco a ser trabalhado.
“A gente entende que muitas vezes além do conceito dos princípios de bem-estar animal chegar distorcido ao produtor, existe sim uma ignorância do que é o bem-estar animal, então isso vai facilitar nesse ponto, essa descentralização nos Estados pra realmente chegar pro produtor rural o que esses princípios podem trazer de retorno econômico pra ele”, explica a coordenadora da Comissão Técnica Permanente de Bem-Estar Animal (CTBEA), Andrea Parrilla.
De acordo com a comissão, ao intensificar as práticas de qualidade de vida dos animais de produção, o país está também se preparando para atender aos critérios do mercado exterior.
“Mercados mais exigentes têm legislações restritas pra bem-estar animal, inclusive um mercado importante pro Brasil, que é a União Européia, tem legislações específicas e a gente entende que futuramente isso vai ser cobrado do Brasil pra exportações”, conclui.