Negociações em vários níveis e em diferentes locais ocorrerão nos próximos dias entre o Brasil a Rússia, envolvendo tanto cotas para exportação de carnes, no âmbito da entrada de Moscou na Organização Mundial do Comércio (OMC), quanto o embargo russo contra mais de 80 frigoríficos brasileiros.
O ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, reuniu-se ontem, em Moscou, com seu colega russo Serguei Lavrov para “consultas políticas”. Ambos concordaram que o encontro não era para negociações, mas trataram de dois temas de mais peso no momento na relação econômica.
Patriota garantiu a Lavrov que o Brasil está “comprometido politicamente” com a entrada da Rússia até o fim deste ano na OMC, sinalizando que Brasília está perto de aceitar um acordo de cotas para carnes.
O ministro brasileiro também levantou o problema do embargo imposto a carnes de Mato Grosso, Rio Grande do Sul e Paraná, embora os dois lados insistam que não há vinculo entre os dois temas. Os brasileiros anunciaram que uma delegação técnica vai nos próximos dias a Moscou para tentar acelerar uma solução. Do lado russo, porém, o plano é voltar a fazer inspeções nos frigoríficos para suspender ou estender o embargo.
Lavrov pediu “celeridade” na negociação para a Rússia poder entrar na OMC na conferência ministerial da entidade em dezembro em Genebra. Patriota confirmou então o apoio brasileiro, mas notou que o é preciso um esforço amplo, porque o calendário da negociação é apertado. O primeiro esboço das listas de compromissos russos de abertura de seu mercado deverá ser publicado em duas semanas se o país quiser se tornar socio até o fim do ano.
Assim, nesta ou na semana que vem negociações bilaterais com o Brasil e outros países precisam estar fechadas. No caso do Brasil, faltam “pingos nos is” ‘sobre a estrutura da cota para carne de frango. Antes, Moscou tinha previsto que a cota seria preenchida sobretudo por coxas e sobrecoxas exportadas pelos EUA.
Na semana passada, Moscou apresentou ao Brasil algumas revisões que contemplam “parcialmente” os interesses brasileiros, segundo um diplomata. Mas estão sendo ultimados alguns detalhes, e “as perspectivas são positivas”.
O segmento produtor e exportador de carnes no Brasil tem pressa, e acredita que só após um acordo na OMC é que a Rússia poderá suspender um embargo que já começa a provocar prejuízos.
Por isso, acha que o Itamaraty precisa concluir logo o entendimento com os russos. Francisco Turra, presidente da Ubabef, entidade que reúne a indústria de carne de frango, deixou claro que seus representados não colocam empecilhos. “Só exportamos 4% do total para a Rússia. A proposta russa beneficiará a suinocultura brasileira, que exporta 43% do total para a Rússia, e não vamos causar dificuldades para isso”, disse ele ao Valor.
Pedro de Camargo Neto, presidente da Abipecs, que reúne exportadores de carne suína, apostava ontem na ação de Patriota em Moscou: “A oportunidade do chanceler Patriota estar em Moscou neste momento é única. Não podemos perder mais tempo. É preciso virar a página da negociação de acesso à OMC e solicitar presteza na questão sanitária que se atrasa sem sentido considerando o histórico de relações Brasil-Rússia”, afirmou.
Na mesma linha, Antonio Camardelli, presidente da Abiec, que reúne os frigoríficos de carne bovina, tem reiterado que a Rússia é, hoje, o melhor cliente do Brasil.
Negociações em Genebra estão marcadas para esta e a semana que vem. Além disso, Moscou enviará um vice-ministro à reunião do Grupo de Cairns, que inclui países exportadores agrícolas, esta semana no Canadá. Paulo Mesquita, diretor do Departamento Economico do Itamaraty, vai rever com os russos as cotas finais para carnes no mercado russo até 2020, e uma delegação brasileira vai a Moscou esta semana para discutir a questão sanitária.
Mas, se o Brasil tem pressa, os russos têm outro ritmo. O serviço veterinário estatal Rosselkhozadzor informou à agência Interfax, de Moscou, que planeja fazer inspeções em frigoríficos brasileiros neste quatro trimestre para decidir, “antes do fim do ano”, se suspende o embargo ou se amplia a proibição a outros Estados. Segundo o porta-voz russo, as medidas tomadas pelo Brasil não são adequadas para os riscos. Um representante do setor privado brasileiro reclamou: “Isso é terrorismo”.