O Estado de São Paulo está tentando entrar em acordo com o setor frigorífico para resolver o impasse provocado por autuações fiscais relacionadas ao uso de incentivos fiscais do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em outros Estados. Por considerar ilegal os incentivos, a Fazenda paulista deixou de reconhecer parte do crédito do imposto declarado pelas empresas nas transferências de mercadorias a São Paulo.
A Fazenda estuda reconhecer um volume maior de créditos do imposto autuado e propor no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) a redução do ICMS do setor para 4%.
Segundo o secretário de Fazenda, Andrea Calabi, a discussão em torno de autuações relacionadas à guerra fiscal tornou-se praticamente generalizada no setor. O frigorífico JBS tem R$ 1,2 bilhão em autuações relacionadas a créditos não aceitos pelo Estado de São Paulo em compras de gado e transferência de carne.
Entre as discussões com perdas possíveis mencionadas nas demonstrações financeiras, a Marfrig considera que os processos de maior relevância relacionados ao ICMS são movidos pela Fazenda paulista. A empresa tem, segundo o balanço, R$ 196,07 milhões discutidos administrativamente sobre o assunto. São cobranças relacionadas ao crédito de imposto que São Paulo não reconhece nas mercadorias remetidas pela filial em Mato Grosso do Sul para as unidades paulistas.
A Fazenda tem, por enquanto, consultado informalmente os frigoríficos com propostas de acordo. A ideia, diz Calabi, é reconhecer uma parte dos créditos do imposto que hoje estão sendo questionados pela Fazenda paulista. Levando em conta operações interestaduais com alíquota de 12% de ICMS, exemplifica Calabi, a Fazenda reconhecia apenas 3% e não permitia que a empresa usasse os 9% restantes de créditos, que eram alvos de autuação fiscal. A Fazenda, diz o secretário, passaria a reconhecer uma parte maior de créditos – que poderia chegar a 6% no total. O acordo também pode incluir o pagamento do débito restante com os créditos de ICMS que os frigoríficos tendem a acumular em razão das exportações.
Outra proposta é reduzir para o setor a alíquota interna e interestadual de ICMS para 4% e, assim, solucionar a discussão em torno dos créditos não reconhecidos. Atualmente há um convênio do Confaz que estabelece a alíquota em 7% para carnes. “São apenas conversas iniciais. Se todos os frigoríficos aceitarem, precisamos levar o assunto para aprovação no Confaz”, diz Calabi. Ele lembra que é necessário verificar se algum Estado irá se sentir prejudicado.
Procurados, a Associação Brasileira da Indústria Exportadora de Carne (Abiec) e o frigorífico Minerva não comentaram o assunto. A Marfrig declarou que a informação “não é verdadeira e, por isso, não vamos comentar”.
Francisco de Assis e Silva, diretor-executivo de relações institucionais da JBS, diz que a companhia não recebeu nenhum proposta oficial da Fazenda. As conversas, por enquanto, são apenas informais. De qualquer forma, diz, levando em conta uma alíquota interestadual de 12%, um reconhecimento de crédito menor que 9% é inegociável. O executivo diz que o frigorífico considera todo o crédito de imposto devido.
Silva diz que a interpretação da Fazenda sobre o recolhimento de ICMS em outros Estados é equivocada. “São Paulo diz que recolhemos 3% em outros Estados. Mas não é isso. Esse percentual é apenas o resultado do recolhimento simplificado de apuração do ICMS. É o imposto devido ao final do dia.”
Silva refere-se ao sistema de débitos e créditos do imposto. No sistema de cálculo do ICMS, as empresas recolhem o imposto devido sobre as mercadorias que vendem, mas usam o crédito do ICMS pago na compra de insumos. O crédito é descontado do imposto devido.
Segundo Assis, alguns Estados, em vez de manterem o sistema de débitos e créditos, estimaram em 3% a alíquota efetiva do ICMS devido após o cálculo sobre as vendas e depois do desconto do imposto pago na compra de insumos. Para ele, a alíquota de 4% pode ser interessante. Ele ressalta, porém, que a discussão essencial não está no percentual da alíquota. “O importante é que São Paulo reconheça o crédito do imposto.”
Silva também diz que não é possível tentar um acordo sobre as autuações fiscais, se os julgamentos sobre eles não forem paralisados. A JBS tem R$ 1,2 bilhão em autuações da guerra fiscal, que vêm sendo discutidas administrativamente pela empresa. A companhia diz no balanço que propôs ações judiciais para obrigar os Estados que concedem incentivos a ressarci-la, caso as autuações sejam mantidas.
Ao mesmo tempo que tem as autuações, a companhia contabiliza R$ 1,06 bilhão em créditos de ICMS originados em exportações. Parte dos créditos, diz Assis, é contra a Fazenda de São Paulo que, segundo ele, não tem restituído os valores. Essa foi uma das questões de “eficiência fiscal” que fizeram o frigorífico suspender as operações na unidade de Presidente Epitácio (SP), afirma.