Não faz muito sentido imaginar que, com o mundo crescendo pouco em 2012, o Brasil vá se descolar e avançar a uma taxa elevada, quando até a poderosa China, segunda maior economia do planeta, se prepara para crescer bem abaixo da média histórica dos últimos anos. As perspectivas para a economia global, mesmo num cenário sem ruptura, não são animadoras.
Segundo estimativas do Fundo Monetário Internacional, que ainda podem ser revistas para baixo, em 2012 a zona do euro deve crescer apenas 1,1%, os Estados Unidos, 1,8%, e os países emergentes e em desenvolvimento, 6,1%. Por que, nesse ambiente, o Brasil cresceria 5%?
Como tem ocorrido nos últimos anos, governo e mercado têm expectativas distintas. No governo, o Ministério da Fazenda fala em expansão entre 4% e 5% em 2012. No mercado, segundo o boletim Focus, a mediana das expectativas aponta para 3,4%. O Banco Central (BC) divulga sua projeção amanhã, como parte do Relatório de Inflação de dezembro, mas o presidente Alexandre Tombini anunciou ontem, no Senado, que espera um crescimento maior que o deste ano, que deve ficar, na melhor das hipóteses, em 3%.
Estímulos não mudam política de juros
Na semana passada, o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, disse, em entrevista à Bloomberg, que o Produto Interno Bruto (PIB) deve crescer 4% em 2012, mas, no fim do ano, deverá estar rodando a 5%, em termos anualizados. Na última sexta-feira, a presidente Dilma Rousseff declarou, em entrevista, que crescer 5% no ano que vem é uma meta do governo.
Em geral, autoridades projetam taxas elevadas de crescimento para animar o chamado espírito animal dos empresários – um integrante da equipe econômica brinca: “Mais selvagem do que animal”. A ideia é que o governo dispõe de mais informações que o mercado e, portanto, sabe o que está dizendo quando prevê uma determinada taxa. Dentro dessa lógica, movido por previsões oficiais, o empresário se sentiria mais motivado a investir no aumento da produção.
Há um quê de fantasia nessa história porque há no mercado, tanto no sistema financeiro quanto nas grandes empresas, departamentos econômicos sofisticados com capacidade para fazer projeções acuradas. Na verdade, quando o governo afirma, mesmo na contramão da maioria das opiniões, que o PIB avançará “x” por cento num determinado momento, os agentes econômicos entendem que Brasília fará o que for necessário para materializar essa taxa de expansão.
É, aí, que mora o problema. O BC está no meio de uma batalha para trazer a inflação a níveis próximos da meta oficial (4,5%). Em 2010 e neste ano, o IPCA, o índice oficial de preços do regime de metas, ficou bem acima do objetivo – respectivamente, 5,9% e 6,5% ou algo acima disso (o número definitivo só será conhecido em janeiro). Pelas projeções do último Relatório de Inflação, divulgado em setembro, o IPCA só cairá à meta no terceiro trimestre de 2013.
O BC já obteve as primeiras vitórias. No pior momento do passado recente, o IPCA acumulou variação em 12 meses de 7,31% (em setembro). De lá para cá, vem cedendo e deve cair, segundo estimativas de autoridades do BC e do próprio mercado, para 5,44% nos 12 meses até maio de 2012, um recuo significativo – de 1,87 ponto percentual.
Se o governo cair na tentação, como fez em 2009 e 2010, de estimular a economia a qualquer preço, produzirá dois efeitos. O primeiro é prejudicar a política de combate à inflação. O segundo é obrigar o Banco Central a interromper o processo de redução da taxa básica de juros (Selic), iniciado em agosto.
Na mesma entrevista à Bloomberg, o secretário Nelson Barbosa afirmou que as medidas para estimular o crescimento em 2012 já estão dadas, ou seja, ele não vê necessidade de novos incentivos, pelo menos não por ora. É um bom sinal.
O BC, por sua vez, avalia que as iniciativas anunciadas, inclusive na área de crédito (redução do IOF e relaxamento de algumas medidas macroprudenciais), não mudaram o cenário com que vem trabalhando desde o início do processo de redução dos juros, ocorrido em agosto.
Trata-se, igualmente, de uma boa notícia. Significa que o BC não vê, nas medidas adotadas pelo governo até agora, um estímulo demasiado à demanda, que o obrigue a rever a estratégia de política monetária. No cenário com que trabalha, o banco contempla o cumprimento da meta cheia de superávit primário das contas públicas em 2012 (algo em torno de 3,1% do PIB) e crescimento moderado da oferta de crédito na economia.
Isso permitirá ao BC continuar reduzindo a taxa Selic, provavelmente enquanto a inflação em 12 meses estiver em queda, portanto, até maio. Se a situação externa não se agravar, isto é, se não houver um evento de crédito (calote de um banco ou de um governo) na zona do euro no próximo ano, a tendência é que o BC siga promovendo ajustes moderados nos juros, entendidos por todos como cortes de 50 pontos-base (0,5 ponto percentual) a cada reunião do Comitê de Política Monetária (Copom).
Cristiano Romero é editor-executivo e escreve às quartas-feiras.
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