Brasil e Estados Unidos chegaram ontem (17/06) a um acordo para evitar a escalada do conflito comercial provocado pelos subsídios ilegais americanos aos produtores locais de algodão. O Brasil concordou em suspender, pelo menos até 2012, as medidas retaliatórias, como aumento de tarifas de importação, contra 103 tipos de produtos americanos, autorizadas pela Organização Mundial de Comércio (OMC). A retaliação, uma resposta aos subsídios desleais ao algodão dos EUA, tinha início previsto para segunda-feira.
A data de 2012 foi escolhida porque nesse ano o Congresso americano fará a revisão da lei agrícola. O Executivo dos EUA comprometeu-se a, até lá, negociar com os parlamentares um novo formato para a lei, que ajuste os mecanismos de apoio ao produtor às regras de comércio internacionais. Os EUA aceitaram, enquanto isso, mudanças limitadas nos seus programas de subsídio e de crédito à exportação para produtores de algodão. Concordaram, também, em compensar os prejuízos do Brasil, financiando com US$ 147 milhões anuais, um fundo de apoio aos produtores de algodão no Brasil.
“Estamos convencidos de que não é o melhor acordo, mas é o possível”, comentou o secretário-executivo da Câmara de Comércio Exterior (Camex), Helder Chaves. “A retaliação, no nosso ponto de vista, sempre foi uma maneira de forçar os americanos a tomar as medidas necessárias”, disse um dos principais negociadores brasileiros, o embaixador do Brasil na OMC, Roberto Azevedo. Ele informou que os representantes do setor privado consultados pelo governo viam com preocupação o lançamento de sanções contra os EUA no caso do algodão.
“O que sempre defendemos foi a pressão”, endossou o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), Haroldo Cunha. “Acredito que haverá mudanças (nos subsídios americanos) ainda que não na dimensão que gostaríamos”, previu. A decisão de financiar com recursos orçamentários americanos um fundo de compensação aos produtores brasileiros já provoca lobby de grupos de contribuintes pela mudança da lei agrícola, acrescentou.
O fundo para produtores de algodão terá recursos depositados em uma agência do Banco do Brasil nos EUA e deve começar a operar na segunda-feira, previu o diretor do Departamento Econômico do Itamaraty, Carlos Márcio Cozendey. O governo dos EUA se comprometeu ainda a limitar os subsídios ao algodão a níveis inferiores aos aplicados entre 1999 a 2005 e manter consultas trimestrais com o Brasil para discutir como esses limites serão aplicados na futura lei agrícola.
Os EUA decidiram, também, mudar o sistema de crédito à exportação para os cotonicultores, reduzindo gradativamente o prazo de pagamento (médio) dos atuais 22 meses para 16 meses – ainda bem acima, porém, do prazo de seis meses negociado como referência na chamada Rodada Doha de liberalização comercial, na OMC. Sempre que o valor das garantias ultrapassar certos níveis (US$ 1,3 bilhão e US$ 1,5 bilhão) os prêmios de risco cobrados dos americanos beneficiados subirão (11% e 15%, respectivamente).
O governo não abre mão de rever o acordo e aplicar medidas retaliatórias a qualquer momento, alertou Azevedo. “O acordo nos permite continuar a trabalhar para o fim da disputa do algodão”, saudou o Representante Comercial dos EUA, Ron Kirk. “Ele melhora a habilidade dos EUA e do Brasil em aproveitar nossa dinâmica relação comercial.” O secretário de Agricultura, Tom Vilsack, disse que o acordo permitirá aos EUA evitar sanções e manter seus programas agrícolas enquanto faz ajustes e adapta a futura lei agrícola.
A solução foi criticada, porém, por um dos principais especialistas no assunto, Pedro Camargo Neto, um dos mentores do processo contra os EUA na OMC. Para ele, o governo perdeu a oportunidade, em abril, de arrancar mais concessões dos EUA e não conseguiu o principal objetivo de reduzir significativamente os subsídios agrícolas ao algodão. A associação do setor concordou porque terá o dinheiro do fundo concedido pelos americanos, disse o economista.