Redação (24/12/2008)- Não foi por falta de aviso. Quatro anos após o alerta dos produtores, a “bolha do subprime agrícola” rompeu e empurrou a agricultura mato-grossense para a pior crise da sua história. A leitura deste cenário pôde ser tirada na semana passada, quando bancos ligados às grandes montadoras agrícolas – CNH (Case/New Holland) e DLL – começaram a apreender, nas fazendas, plantadeiras, tratores, pulverizadores e colheitadeiras dos produtores como garantia de pagamento. O banco da John Deere não fez apreensões ainda, mas está incluindo todos os produtores inadimplentes em serviços de proteção ao crédito como a Serasa. As apreensões estão ocorrendo devido ao não pagamento da parcela da dívida vencida no último dia 15 de outubro.
O acúmulo dos passivos do segmento pode ser comparado às hipotecas podres (subprime) que estouraram a crise mundial, inicialmente nos Estados Unidos. Já a bolha no agronegócio estadual teve início na safra 04/05 quando houve desequilíbrio entre custos de produção e cotação dos grãos, principalmente da soja, da qual, o Estado é o maior produtor nacional. Naquela ocasião, o dólar valorizado corrigiu o preço dos insumos agrícolas e na hora de negociar a safra, a desvalorização imperou sobre cotações e até mesmo sobre o câmbio. De lá pra cá, o subprime rural, se avolumou safra após safra, vindo a estourar agora.
Só este ano, de acordo com o Instituto Mato-grossense de Economia Agrícola (Imea), o montante das dívidas dos produtores a serem liquidadas junto aos bancos passa de R$ 1 bilhão, para uma dívida total estimada em cerca de R$ 10 bilhões.
Por enquanto, os nomes dos produtores executados estão sendo mantidos em sigilo. “Se o nome aparecer, ele poderá quebrar no dia seguinte porque não conseguirá mais financiamentos”, afirma o diretor administrativo da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado (Aprosoja) e presidente da Comissão de Endividamento Rural de Mato Grosso, Ricardo Tomczyk.
Na região sul do Estado, vários agricultores estão sendo surpreendidos com ordem de apreensão de máquinas e equipamentos agrícolas nas fazendas. Somente no cartório de Rondonópolis (210 quilômetros ao sul de Cuiabá), mais de 70 notificações extrajudiciais já haviam sido protocoladas pelos bancos e 16 apreensões de máquinas já estavam confirmadas. A investida dos bancos também alcança agricultores de Alto Garças (sul), Barra do Garças (leste), Diamantino (médio norte), Sorriso (norte) e Campo Novo (noroeste), com o número de execuções podendo ultrapassar a 40.
“Dezenas de produtores já foram notificados pelos bancos, que não estão respeitando a resolução 3637/CMN, que dá prazo até 12 de dezembro para o produtor protocolar o pedido de negociação da dívida”, denuncia o presidente do Sindicato Rural de Sinop (503 quilômetros ao norte de Cuiabá), Antônio Galvan.
“De norte a sul do Estado estamos sofrendo o ataque dos bancos. É uma insensatez, não poderia ocorrer num pior momento, justamente agora que as máquinas estão em uso total. Alguém poderia explicar como vamos fazer os tratos culturais e colher o que foi plantado este ano?”, questiona o presidente da Comissão de Endividamento Agrícola do Estado, Ricardo Tomczyk.
MAGGI – Em entrevista esta semana à Agência Folha, o governador Blairo Maggi (PR) admitiu que a agricultura brasileira está diante de uma das mais graves crises da história. E, segundo ele, com conseqüências imprevisíveis para o agronegócio, setor que nos últimos anos tem sustentado a política econômica do governo federal e estadual.
Ainda de acordo com Maggi, a diferença do momento atual em relação às outras crises do setor está na dificuldade de obtenção de crédito, com as tradings ou com as instituições financeiras nacionais e internacionais. "O problema é que o fluxo de caixa, que antes era obtido com o crédito, praticamente secou".
Segundo levantamento da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado (Famato), os produtores estão sem perspectivas de crédito para a próxima safra e 70% dos agricultores deixaram de pagar seus débitos na parcela de R$ 1 bilhão do financiamento de máquinas agrícolas que venceu em 15 de outubro. “Não temos qualquer perspectiva. A situação realmente é dramática e não sabemos o que irá acontecer na frente”, diz o presidente da entidade, Rui Ottoni Prado.
Para ele, os bancos que estão executando os produtores estão com uma política totalmente equivocada. “É preciso uma intervenção do governo para impedir que os bancos se aproveitem deste momento e afundem ainda mais a agricultura no caos”, alertou.