Fonte CEPEA

Carregando cotações...

Ver cotações

"Minha marca será a marca da crise", admite Rodrigues

<p>Mas o ministro da Agricultura diz que será lembrado "por lutar vigorosamente todos os dias".</p>

Da Redação 08/11/2005 – Uma no cravo, outra na ferradura. Dessa forma age o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, quando reflete sobre seus 34 meses de gestão e o tratamento dispensado pelo governo Lula ao setor agropecuário.

Em entrevista ao Valor, Rodrigues afirmou que a recuperação do setor agropecuário, que vive uma das piores crises de renda da história recente, só ocorrerá no próximo governo, a partir de 2007. Admitiu também que o cenário para a atual safra 2005/06, que começa a ser colhida a partir de dezembro, será ainda mais difícil que o ciclo concluído em junho. “É um ano dificílimo, mas vamos começar a sair do final do ciclo negativo iniciado em 2003. Tudo isso depende, todavia, de uma lição de casa a ser feita internamente”.

Num rápido balanço dos erros e acertos do governo na condução do setor, Rodrigues criticou os efeitos da política macroeconômica e da valorização do real na redução de recursos para o setor, mas reiterou que “roupa suja se lava em casa”. “Os preços continuam muito baixos e a questão cambial tira a competitividade de vários produtos. Não há produto que não tenha sido afetado por isso”, afirmou.

Rodrigues admitiu que sua gestão será associada à crise agrícola e à volta da febre aftosa, mas que trabalha “vigorosamente” pelo setor. “A minha marca será a marca da crise”, disse. “É a marca de gestão de crise em todos os níveis: da agricultura e de uma crise de solução da crise”. Mas ressalva: “Serei lembrado por lutar vigorosamente sem parar todos as semanas e os meses do ano”.

Muito criticado por não conseguir recursos adicionais do Tesouro para socorrer o setor, o ministro minimizou a briga política em que está metido – de um lado os “aliados” da oposição ao governo Lula no Congresso cobram mais atitude; de outro movimentos sociais, como os sem-terra, criticam os transgênicos e o agronegócio. “O que digo ou deixo de dizer dentro do governo, não vou dizer de público. Se há críticas sobre a forma como me manifesto publicamente, faz parte do jogo. Lógico que isso fica chato. Dá a impressão de pouca ação política, Mas não é assim. Tenho trabalhado politicamente, duramente, o tempo todo. Agora, roupa suja se lava em casa”, disse.

Em 2006, Rodrigues quer mais intervenção do governo. Pediu mais crédito, juros menores e dinheiro para finalmente fazer decolar o seguro rural. “Este ano faltou apoio à comercialização na hora adequada. Chegou muito tarde. Precisamos de crédito mais vigoroso e de taxa de juros menores. Precisamos substancialmente de apoio ao seguro rural com orçamento para a subvenção do prêmio. Temos R$ 48 milhões para 2006, mas ainda é muito pouco”.

Rodrigues disse que as coisas avançam em “suspiros”, mas elogiou os ministros Antonio Palocci (Fazenda) e Dilma Roussef (Casa Civil). Reclamou que “há dois meses” pede à Fazenda um “adicional” de R$ 2 bilhões que não são liberados porque demandam uma equalização de R$ 60 milhões do Tesouro, mas lembrou o pesado endividamento dos produtores por causa de tecnologia.

Ao seu público, Rodrigues lembrou que “ninguém fica rico ou quebra” de repente. “A agricultura é uma atividade cuja renda se consolida no lapso de uma geração. Ninguém fica rico ou quebra em 25 anos. É aproveitar os ciclos das vacas gordas para prever as vacas magras. No longo prazo, se ganha dinheiro e cresce. Não fica milionário, mas não quebra e tem boa qualidade de vida”. E criticou o “comportamento de manada” dos produtores. “Nunca plante um produto quando está muito acima da média. Ele só pode cair”, afirmou.

De passagem, criticou a política econômica de Palocci. “Um buraco de R$ 17 bilhões com uma política macroeconômica lastreada em mecanismos de juros altos, que induzem à valorização da moeda nacional, não tem política que resolva. É um dado da realidade. Só se o governo tivesse os R$ 17 bilhões. Não existe isso”, afirmou. Segundo ele, porém, o governo poderia “fazer algumas coisas”, como ter recursos para apoiar a comercialização e impedir que os preços caíssem a níveis como nos casos do arroz e do algodão. “O governo não interveio tempestivamente. Não conseguiu por razões de postergação de recursos, dada a política macroeconômica de superávit primário elevado para combater a inflação. Faz parte de uma decisão macro do governo e tenho que respeitar. Isso produziu um mal-estar na agricultura. Mas fizemos enorme esforço na seca. Mas R$ 4 bilhões de custeio foram prorrogados, todos eles nas taxas equalizadas. Num ano de crise de renda, sem atendimento adequado na comercialização, tivemos menos recursos porque não voltaram os R$ 4 bilhões e a uma taxa de juros mais alta. Tudo errado!”

Também disse que para combater a aftosa é preciso “gente” e não apenas recursos. “A área de carnes foi surpreendida por uma morte anunciada. O problema não é a SDA, é de origem: tivemos um orçamento cortado. Se tivesse muito mais recursos, teria mais condições de fiscalizar. O problema não é só dinheiro, é gente. Precisa fazer concurso, são vários fatores que afetam isso. Tem muita coisa para fazer na defesa”, afirmou.

Rodrigues também criticou a falta de investimento em logística e infra-estrutura. “Tem faltado recursos para investimento em logística de forma dramática. É um horizonte negativo, uma questão de prioridades”. Segundo ele, a soja de Mato Grosso saiu de US$ 18 por saca com dólar a R$ 4 para US$ 11 com dólar a R$ 2,20. “Não tem mais jeito de bancar a logística ruim com essa renda”. Mas defendeu sua colega responsável por tocar a máquina: “A Dilma é ótima, uma executiva que olha para frente, vai resolvendo, rompendo as barreiras. Gosto muito dela. É uma bela ministra”.