A nova versão do projeto de lei que estabelece a fiscalização da produção agropecuária por autocontrole corta pela metade o aumento sugerido pelo governo nos valores das multas aplicadas às agroindústrias por inconformidades. Considerado “exagerado” pelo relator, deputado Domingos Sávio (PSDB-MG), o teto das cobranças cai de R$ 300 mil para R$ 150 mil – ainda assim dez vezes maior que o limite atual, de R$ 15 mil.
O substitutivo, apresentado na semana passada, adota o caráter preventivo na fiscalização sanitária e permite que irregularidades “leves” sejam resolvidas antes da autuação. O valor mais alto será cobrado somente para infração gravíssima. A proposta ainda aplica efeito suspensivo às penalidades em caso de apresentação de recurso para evitar “arbitrariedades” e “prejuízos irreparáveis” às pequenas empresas e cria uma comissão especial, que funcionará como terceira instância, para a contestação das ocorrências.
“É preciso ter certo cuidado, pois uma empresa pequena, dependendo do tamanho da multa, pode até fechar as portas”, disse Domingos Sávio. A redução desses valores era um dos principais pleitos da agroindústria no projeto.
A proposta mantém a obrigatoriedade da adoção de programas de autocontrole em todo o processo produtivo por agentes da cadeia do agronegócio e a apresentação de registros sistematizados e auditáveis ao Ministério da Agricultura.
Com apoio financeiro de entidades do agronegócio, a Pasta está desenvolvendo uma plataforma digital – que deverá começar a funcionar em dezembro – para receber as informações do controle do setor. De posse dos dados, o ministério vai definir estratégias de fiscalização por gerenciamento de risco, focada nos pontos mais críticos.
“Quanto aos produtores, não há exigência nova que os coloque em dificuldade. Ao invés de ter a fiscalização no pé o tempo todo, eles vão ser tratados de forma respeitosa e terão mais autonomia”, afirmou Domingos Sávio.
Ele descartou retrocessos ou risco sanitário com a adoção da medida. “O autocontrole não é auto-regulação. Damos mais clareza, mais liberdade e menos amarras para quem produz. Mas a regulação continua 100% do poder público, que vai estabelecer o padrão mínimo de qualidade que ele precisa atender e dar liberdade para a inovação”, disse.
Prioridade da ministra Tereza Cristina, que alega capacidade limitada da máquina pública para aumentar os serviços de controle e fiscalização do setor agropecuário, em parte devido ao déficit de fiscais, a proposta permite que empresas e profissionais credenciados no Ministério da Agricultura prestem serviços técnicos e operacionais relacionados à defesa sanitária nas agroindústrias. Algumas tarefas já estão a cargo da iniciativa privada, como exames de tuberculose bovina e emissão de GTA, informou a Pasta.
O texto preserva as atividades próprias da fiscalização que exigem o exercício de poder de polícia e que deverão ser cumpridas apenas pelos servidores federais. “Não muda uma vírgula do regime de inspeção, sem prejuízo da fiscalização oficial”, defendeu Sávio.
Mesmo assim, a medida gerou críticas dos fiscais. Eles querem a imposição de limites mais claros entre a atuação estatal e o setor privado na nova lei, para evitar incertezas. “O projeto não estabelece um ponto de corte. A atuação privada passa de excepcionalidade para um trabalho de rotina. Faltam proibições”, afirmou Antonio Andrade, diretor de Comunicação do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários (Anffa Sindical).
As atribuições exclusivas dos servidores, como apreensão de produtos, interdição de estabelecimentos e aplicação de penalidades, são indelegáveis e estão preservadas, disse Sávio. Os processos ante e post mortem continuam sob a supervisão da categoria. “Não haverá sobreposição com as atividades dos auditores que exigem o poder de polícia administrativa”, garantiu o ministério.
Segundo o relator, as mudanças propostas valorizam ainda mais a atividade dos servidores e diminuem o “intervencionismo excessivo” do poder público nas indústrias, que por vezes transforma os servidores em “prepostos” das empresas fiscalizadas.
Para o diretor do Anffa, o texto “conduz para que fique aberta ao governo a opção de ter ou não presente um servidor no frigorífico”. O Ministério de Agricultura disse que “não abre mão da função de Estado na inspeção federal” e que o serviço está em aprimoramento contínuo. “Mas não podemos nos furtar a buscar continuamente a melhoria do serviço”.