Fonte CEPEA

Carregando cotações...

Ver cotações

Agroindústria

Integrados de Goiás questionam mudanças em contrato com BRF

Produtores obtiveram decisão favorável na Justiça contra a empresa, que já recorreu

Integrados de Goiás questionam mudanças em contrato com BRF

Produtores integrados de aves e suínos da BRF de Rio Verde, em Goiás, obtiveram na Justiça uma decisão favorável numa ação na qual questionam alterações contratuais feitas pela empresa. Os fornecedores alegam que as mudanças foram impostas de forma unilateral pela companhia e reduziram suas remunerações. É a primeira sentença do gênero a ganhar destaque desde a aprovação da chamada Lei da Integração, em 2016. A BRF vai recorrer.

Na ação, a Associação Goiana dos Integrados Produtores de Aves, Ovos e Suínos (Aginterp) alega que a companhia alterou o contrato de integração sem seu consentimento. Apesar da disputa na Justiça, a entidade diz que os fornecedores não querem o fim do vínculo com a companhia. A Aginterp representa mais de 280 produtores integrados da região, 99,2% dos quais ligados à dona das marcas Sadia e da Perdigão em Rio Verde. A maior parte dos vínculos teve início após a Perdigão ter se instalado no município, em 2003, bem antes da fusão que deu origem à BRF, em 2009.

Entre as medidas que estão no alvo da reclamação está a alteração da base de cálculo do percentual recebido pelos produtores para manutenção e reparos nas granjas, cujo montante caiu de R$ 1,4 milhão para R$ 1 milhão. Os produtores que já não possuíam dívidas referentes aos recursos adiantados por bancos com aval da empresa para os investimentos na construção das granjas nos moldes exigidos pela integradora recebiam 2,65% ao ano sobre esse valor de base, e os que ainda tinham dívidas, 1,77%. Nos dois casos, o percentual passou para 1%.

Os produtores também apontam que, no caso das aves, o número de lotes a serem produzidos para a empresa por ano subiu de 6,2 para 6,5. No caso dos suínos, devem ser entregues 2,87 lotes por ano, e os fornecedores apontam que a BRF ampliou o peso desses lotes de 115 quilos para 130 quilos, o que estendeu o período de engorda de 120 para 133 dias.

Nos intervalos entre a chegada de um lote e outro, a companhia pagava aos integrados uma taxa de ociosidade, já que a granja só pode prestar serviços ao integrador. De acordo com os produtores, a BRF encerrou esse pagamento, que chegou a cerca de R$ 7,4 milhões, distribuídos entre todos os integrados da unidade de Rio Verde, no período ocioso de agosto a dezembro de 2018.

Na ação judicial, os integrados também apontam que a companhia propôs uma redução da “taxa mínima de atratividade”, que era de 7,06%, em 30% por dois anos no caso dos avicultores – mudança que não se concretizou porque a associação entrou na Justiça.

s mudanças foram propostas por meio de documento enviado aos produtores em 27 de setembro de 2018. Segundo os produtores, na ocasião a BRF informou que já implementaria boa parte das alterações sem negociação. Considerando as medidas que foram adotadas, os integrados alegam que tiveram perda de 16% em suas receitas.

“Como se trata de uma relação desigual por natureza, a lei da integração prevê que as alterações de contrato precisam ser negociadas com os produtores. Esgotada essa possibilidade, os produtores buscaram a anulação dessas alterações contratuais na Justiça”, afirma Antonio Mazzucco, do escritório Mazzucco & Mello Advogados, de São Paulo.

Criada em 2016, a Lei da Integração (13.288/16) prevê a existência de Comissões de Acompanhamento, Desenvolvimento e Conciliação da Integração (CADECs), nas quais mudanças contratuais têm de ser discutidas entre as partes. No entanto, nas reuniões entre a BRF e os integrados goianos, não houve um consenso.

Na sentença, publicada em 27 de agosto, o juiz da 3ª Vara Cível de Rio Verde, Wagner Gomes Pereira, anulou as alterações unilaterais, mantendo em vigência o contrato praticado até novembro de 2018, e condenou a empresa a pagar a diferença entre os valores praticados desde então e os previstos no contrato.

Em nota ao Valor, a BRF informou que “tomou conhecimento, com surpresa, da decisão de primeira instância proferida no processo”, e afirma que apresentará “os recursos cabíveis para reformá-la, de forma que o litígio tenha um desfecho justo e em conformidade com a legislação aplicável”. A companhia conta com 11 mil avicultores e suinocultores integrados em todo o país, a maior parte em Estados da região Sul.

Independentemente do desfecho final da disputa, Mazzucco avalia que a decisão em primeira instância pode incentivar outros produtores integrados a questionarem as integradoras de grande porte na Justiça. “Poderá haver impacto também em outras cadeias que usam a integração, como a do tabaco”, afirma.

O sistema de integração é a base da produção de aves e suínos no Brasil. Nele, as indústrias fornecem os insumos e assistência aos produtores e recebem a produção. Mas dados do projeto Campo Futuro, da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), mostram que a produção integrada de frangos não tem apresentado rentabilidade satisfatória para os produtores no país. “Essa situação não se restringe a esta ou a aquela integradora”, afirma Iuri Pinheiro Machado, presidente da Comissão Nacional de Aves e Suínos da CNA.

“Se a lei da integração for de fato respeitada, teremos a sustentabilidade dessas cadeias tão importantes para o nosso país. Caso contrário, perderemos competitividade e eficiência”, diz ele