A colaboração entre pesquisadores brasileiros e noruegueses deve impulsionar novas ações e estratégias em energia solar nos dois países. Foi o que mostrou o 1º Workshop de Energia Solar Brasil-Noruega, realizado no auditório da FAPESP, ação inicial do acordo de cooperação entre a FAPESP e o Conselho de Pesquisa da Noruega (RCN).
“A colaboração com o Brasil nos ajuda a avançar nos desafios globais e aumenta a nossa capacidade e qualidade de pesquisa”, disse Rune Andersen, conselheiro para Ciência e Tecnologia do RCN.
Andersen contou que a Noruega dispõe de dois tipos de financiamento de pesquisa em energia, os programas INPART e UTFORSK. Ambos não têm restrição para apoiar participações internacionais, inclusive de brasileiros. “No ano passado, foram financiados € 9 milhões em pesquisa energética”, disse.
A expectativa é que, com o acordo assinado por FAPESP e RCN, sejam lançadas chamadas de propostas de pesquisas e realizados mais workshops para que haja maior integração entre cientistas dos dois países.
No primeiro workshop, ficou claro que a complementaridade será a palavra-chave na parceria. Brasil e Noruega são grandes produtores de petróleo, gás natural e têm a matriz energética baseada em hidrelétricas. No entanto, enquanto a Noruega exporta o excedente energético das hidrelétricas para países vizinhos e aposta na energia solar para o uso residencial, o Brasil busca usar seu alto potencial solar para aumentar a resiliência e redundância da matriz energética que enfrenta crescimento de demanda e períodos de seca.
“A energia solar até há pouco tempo era considerada coisa do futuro, só que o futuro chegou, mas o Brasil está atrasado em relação aos outros países. Temos um potencial enorme, principalmente no chamado cinturão solar, região que vai do Nordeste até o Sudoeste do país, pegando sobretudo Bahia e Minas Gerais e inclusive São Paulo”, disse Enio Pereira, coordenador do Laboratório de Modelagem e Estudos de Recursos Renováveis de Energia do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Pereira afirma que, embora o investimento em energia solar ainda seja pequeno no Brasil, a fonte renovável está crescendo rapidamente na matriz energética brasileira.
De acordo com dados apresentados em sua palestra, o incremento da energia solar no Brasil foi superior a 300% nos últimos dois anos. É, portanto, a energia cujo uso mais cresce, embora ocupe apenas 0,02% da matriz energética do país.
“A complementaridade das energias é uma questão muito importante e ainda precisa ser melhor explorada. Por causa da crise hídrica, grande parte da energia está sendo suprida por termoelétricas, que são grandes poluidoras e têm alto custo energético. No entanto, onde há seca, há pouca nuvem. Então, há mais insolação exatamente quando a água para alimentar as hidrelétricas é escassa”, disse Pereira.
Caso concreto
No workshop realizado em 13 de novembro, um dos exemplos mencionados foi a parceria da petrolífera norueguesa Statoil com a também norueguesa Scatec Solar, que estão construindo uma planta de energia solar no Rio Grande do Norte, com capacidade de 162 megawatts.
“Na Noruega, estamos crescendo em microgeração por energia solar. Como a radiação não é alta, é muito melhor construir grandes plantas como a que a Statoil está fazendo no Rio Grande do Norte. Somos uma nação focada na produção de energia e estamos desenvolvendo pesquisa em outra área de energia”, disse Morten Dæhlen, decano da Faculdade de Matemática e Ciências Naturais da Universidade de Oslo.
Além da complementaridade – seja entre as pesquisas nos dois países, seja entre as fontes energéticas –, os pesquisadores reunidos no workshop concordam que a introdução da energia solar na matriz energética constitui por si só uma modernização do setor.
“Vamos acelerar o passo em direção às chamadas redes inteligentes de energia. O Brasil tem ainda um sistema elétrico baseado apenas em cargas, mas com a energia solar e a geração distribuída [quando uma residência pode distribuir o excedente da energia solar gerada para outras casas em um bairro, por exemplo] o sistema pode contar com cargas que são também geradores. O problema é que hoje os equipamentos das concessionárias estão, na maioria, preparados para funcionar em um único sentido de fluxo de energia. Ao inverter o sentido em alguns momentos do dia, os equipamentos falham”, disse Fernando Pinhabel Marafão, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Sorocaba.
Segundo Marafão, o Brasil ainda não está preparado para o uso massivo de energia fotovoltaica, mas muito se tem avançado em estudos nesse campo.
“Precisamos automatizar, substituir equipamentos, medidores, sensores, religadores. Para que a geração distribuída funcione efetivamente será preciso toda uma revisão do setor elétrico”, disse Marafão, que coordena um projeto de pesquisa sobre smart grids em parceria com a Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia desde junho deste ano.
Para Dæhlen, só com a digitalização da energia impulsionada pela energia solar e pelos smart grids será possível atingir o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (das Nações Unidas) de número 7, sobre energia limpa e acessível.
“Temos muitos desafios. Apenas um dos 17 objetivos do desenvolvimento sustentável se refere diretamente à energia. Mas todos os outros precisam de energia para serem atingidos”, disse Dæhlen.