Um dos principais polos do agronegócio brasileiro, a região do “Matopiba” (palavra composta pelas primeiras sílabas de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) tem sofrido com a mudança do regime de chuvas e o aumento no período de estiagem. Por causa das condições climáticas, a produção de grãos nos últimos três anos foi menor do que a prevista pelos produtores, causando impactos econômicos na região. Em um momento em que a gestão da água torna-se cada vez mais importante para a economia da região, a The Nature Conservancy, maior organização ambiental do mundo, em colaboração com a Bunge e com apoio da Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba) e da Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais), lança a publicação Boas Práticas Agrícolas e Água, um guia para a conservação de recursos hídricos nas propriedades rurais do Oeste da Bahia. Fruto de levantamentos e debates com os produtores e os governos municipais da região, o livreto sugere técnicas e práticas produtivas para melhorar a gestão ambiental das propriedades rurais em relação ao manejo dos solos e da água. Os objetivos são evitar a erosão, aumentar a eficiência no uso da água nas lavouras, recuperar as matas ciliares e contribuir para a conservação de rios e nascentes.
“Além das dificuldades que os produtores enfrentam atualmente, é importante lembrar que no mundo todo as mudanças climáticas devem tornar o regime de chuvas ainda mais imprevisível. As regiões que souberem usar os recursos naturais de forma sustentável estarão mais preparadas para esses desafios, o que significa que, para quem vive do campo, cuidar do meio ambiente é garantir emprego e renda para as famílias, hoje e também no futuro.”, resume Giovana Baggio, gerente de Agricultura Sustentável da TNC.
A porção baiana do Matopiba é composta por 30 municípios, localizados no oeste do estado, e conta com dois perfis variados de produção agrícola. Na área de vale em torno do Rio Grande, predomina a agricultura de subsistência com cultivos como arroz, feijão, mandioca e milho. Já no trecho de Cerrado, por ser predominantemente plano, houve incentivo à mecanização, o que atraiu culturas mais ligadas à agricultura empresarial, como a soja, e estimulou a expansão da produção. Para se ter uma ideia, o PIB agrícola da região alcançou 2,4 bilhões de reais, em 2010, dado mais recente disponível, compilado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). De 2011 em diante, houve também a intensificação dos cultivos, por meio da aplicação de novas tecnologias, o que elevou a produtividade. A previsão é de ainda mais crescimento, para os próximos 10 anos: municípios como Formosa do Rio Preto e São Desidério estimam uma elevação na produção de soja da ordem de 33% e 40%, respectivamente, segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
Parte da produção agrícola local exige irrigação para ser mais produtiva, por isso, sua expansão leva, em alguma medida, a um aumento da demanda por água. Levando-se em conta que o crescimento acelerado das zonas urbanas, movido pela renda que o agronegócio traz, também eleva a demanda, é possível prever que a pressão sobre os recursos hídricos do Oeste da Bahia deve continuar crescendo na próxima década. Outro fator chave para a disponibilidade de água são as mudanças climáticas. Embora ainda faltem estudos conclusivos, levantamentos realizados em estações meteorológicas da região, localizadas em 8 sub-bacias, mostram uma maior concentração sazonal das chuvas, o que leva a períodos mais longos de estiagem. Isso reforça a tendência de redução das vazões médias dos rios Grande, Corrente e Fêmeas, que estão entre os principais da região, e no longo prazo pode provocar a redução do volume de água do Aquifero Urucuia, fundamental para a irrigação nas lavouras.
Como forma de garantir a conservação desses rios e a recarga da água do subsolo no cenário que se desenha, o Guia de Boas Práticas identificou a necessidade da realização de monitoramento contínuo e aprofundado do volume dos rios e das águas subterrâneas e superficiais, além de maior incentivo ao cumprimento do Código Florestal, assistência técnica continuada aos produtores rurais, para que eles promovam o manejo correto de solos e água, e incentivo à restauração da vegetação que protege rios e nascentes.
A publicação também explica como o produtor pode adotar métodos que tragam ganhos econômicos e ambientais às suas fazendas. Um exemplo é a aplicação da técnica da muvuca, como é conhecido o plantio mecanizado de sementes de várias espécies nativas de uma só vez, para a restauração de matas ciliares degradadas, as chamadas Áreas de Preservação Permanente (APP). O Código Florestal brasileiro define que o produtor rural deve recuperar a vegetação de sua propriedade quando ela se encontra em trechos como margens de rios e nascentes e encostas de morro – dois exemplos de APPs. Porém, muitos produtores esbarram no custo e na falta de orientação sobre as técnicas mais eficientes para a restauração. A muvuca reduz a necessidade de investimento em até 50% e pode ser feita com o uso das mesmas máquina utilizadas no plantio do milho e da soja, cultivos muito comuns na região. Ambientalmente, a muvuca traz o benefício de facilitar a recuperação de matas ciliares, fundamentais para a conservação das fontes de água.
“A Bunge apoia essa publicação por considerar de extrema importância que práticas sustentáveis sejam adotadas em todos os elos da cadeia produtiva, principalmente no campo, onde tudo começa”, afirma Michel Santos, diretor Global de Sustentabilidade da Bunge.
Para adaptar ao máximo o livreto às necessidades locais, a TNC e a Bunge consultaram os próprios produtores e outros atores locais do Oeste da Bahia. Em dezembro de 2015, por exemplo, as organizações promoveram um encontro em Luís Eduardo Magalhães, um dos municípios de Matopiba, em que mais de 30 produtores, além de representantes de governos e organizações locais, puderam discutir boas práticas agrícolas e manejo de água e solos na agricultura. No evento, houve uma primeira sensibilização para o tema, a partir de palestras da AIBA e da SLC Agrícola, entre outros. As opiniões e os temas de discussão identificados no encontro ajudaram na elaboração do guia.
TNC e Bunge trabalham no Oeste da Bahia desde 2013 e já contribuíram para o mapeamento da região e a expansão do Cadastro Ambiental Rural (CAR), o primeiro passo para a regularização ambiental das propriedades. Também apoiaram as prefeituras de municípios como Luis Eduardo Magalhães, Formosa do Rio Preto e São Desidério na melhoria da sua capacidade de monitoramento do território, ao oferecer gratuitamente o Portal Ambiental Municipal, um programa que otimiza a gestão de dados sobre as propriedades e seus passivos ambientais, além de treinamento aos funcionários para utilizarem o programa.