O crescimento da economia da China deverá declinar de 7%, em 2015, até 4,2% em 2024, e essa desaceleração, entre outros reflexos, reduzirá em alguns bilhões de dólares o ritmo de expansão das exportações agrícolas brasileiras. Esse é o cenário traçado pela FAO (agência para agricultura e alimentação das Nações Unidas) e pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em uma versão preliminar do relatório conjunto que as entidades divulgarão com as perspectivas para o agronegócio global nos próximos dez anos, ao qual o Valor teve acesso. Esse relatório, cuja versão definitiva será divulgada no segundo semestre, inclui um capítulo de mais de 50 páginas sobre o setor no Brasil, o quinto maior país agrícola do mundo.
A crescente importância da Ásia para as exportações de produtos brasileiros do agronegócio deriva essencialmente da demanda da China. Em 2000, o país era o 11º maior mercado para os embarques setoriais do Brasil. Importou menos de US$ 500 milhões, ou 3% do total. Em 2012, os chineses já foram os maiores importadores, com quase US$ 16 bilhões (19% do total). Naquele ano, as compras dos EUA somaram US$ 5 bilhões.
Particularmente nos últimos cinco anos, as vendas brasileiras de produtos como soja, óleos vegetais, algodão, açúcar e frango ao mercado chinês aumentaram de forma expressiva. Em 2014, A China absorveu cerca de 71% das exportações da oleaginosa, ou 31 milhões de toneladas, nas contas da FAO e OCDE. Esse volume representou cerca de 35% da produção total do grão do Brasil na safra 2013/14. No caso dos embarques de óleos vegetais e algodão, as participações chinesas nas exportações brasileiras de 2014 chegaram a 28% e 24%, respectivamente. No açúcar, o percentual alcançou 9,5% e na carne de frango, foi a 6,4%.
Ocorre que, após mais de três décadas de crescimento acelerado, a economia da China está entrando em uma “nova normal”, com um menor ritmo de expansão. O governo chinês baixou sua meta de crescimento para cerca de 7% em 2015. Até chegar aos 4,2% previstos pela FAO e pela OCDE para 2024, a queda tende a ser contínua. Consequentemente, as exportações do agronegócio brasileiro para a China vão continuar crescendo, mas em ritmo menor. Os embarques de oleaginosas, basicamente soja, poderão chegar a 47 milhões de toneladas em 2024, o que significa um aumento anual em relação aos volumes atuais de 3,9%, ante 18,9% na última década.
As duas organizações observam que as exportações de óleos vegetais para o mercado chinês, sobretudo de soja, alcançaram 950 mil toneladas em 2012, mas recuaram para 360 mil toneladas no ano passado. Considerando que a China nesta frente concentra suas importações no grão, para processamento por indústrias locais, e não o óleo vegetal, os embarques brasileiros poderão cair para apenas 200 mil toneladas em dez anos, segundo a FAO e a OCDE.
O peso da China no mercado agrícola internacional é indiscutível. O relatório das entidades pontua que o país asiático ainda terá de superar muitas incertezas no futuro, como a transição de seu modelo de economia, e que esse processo terá reflexos importantes para o Brasil, grande exportador.
O impacto ocorrerá tanto diretamente, por meio do comércio bilateral, como indiretamente, no que se refere à mudança de patamar dos preços globais, que de alguma maneira são transmitidos aos mercados domésticos de todos os países. Ou seja, a dimensão da demanda agrícola chinesa afeta também o ritmo de crescimento dos parceiros. A maior demanda chinesa eleva os preços mundiais dos produtos agrícolas, e isso motiva os agricultores a investir no aumento da produção.
Para chegar aos números que serão apresentados no segundo semestre, FAO e OCDE levaram em conta ritmos de crescimento da economia chinesa 25% maior ou 25% menor do que o previsto no cenário-base usado nas projeções. De uma maneira ou de outra, os maiores impactos serão sentidos pelos mercados brasileiros de soja em grão, óleos vegetais e açúcar. Os efeitos nas exportações de algodão e de frango serão menores.
No horizonte que considera uma expansão 25% maior que a prevista na economia chinesa no cenário-base, as importações totais de oleaginosas do país aumentaria 2,9 milhões de toneladas – e metade desse volume viria do Brasil. O preço ao produtor brasileiro poderia subir 2,6% com essa expansão do mercado chinês, o que, por sua vez, estimularia o incremento da produção em 2,4 milhões de toneladas.
No entanto, se a China crescer ainda menos que previsto nos próximos dez anos, não apenas as exportações brasileiras de oleaginosas para aquele mercado seriam 1,4 milhão de toneladas menores em 2024, como as exportações totais desse produto pelo país declinariam mais 400 mil toneladas. Isso resultaria em baixa de 3,2% nas vendas e de 2,1% na produção brasileira. O resultado mostra a mesma tendência para outras commodities.