Uma queda acentuada nos preços da soja e do milho no segundo semestre ameaça uma boa rentabilidade dos agricultores brasileiros na safra que será plantada em poucas semanas, num momento em que os custos de produção caíram menos que as commodities agrícolas.
Apesar disso, produtores capitalizados após várias safras com bons lucros ainda não indicam redução das intenções de plantio na temporada 2014/15, disseram especialistas nesta quinta-feira.
“A relação de troca para a próxima safra ainda é uma incerteza”, lamentou Wilson Andreassi Filho, diretor da Fénix, uma empresa que gerencia compra de insumos para diversos produtores da região da Jataí (GO).
A relação de troca é uma medida muito utilizada no dia-a-dia do campo: representa quantas sacas de soja ou milho precisarão ser colhidas para pagar os custos de cada hectare. Se o preço do grão cai e os custos não acompanham, será necessário “gastar mais sacas” para plantar a mesma área, reduzindo o lucro do agricultor.
Andreassi conta que seus clientes fecharam a relação de troca, para aquisição de sementes, fertilizantes e defensivos, entre 18 e 22 sacas de soja por hectare, na última temporada. Como os preços da nova safra são incertos, mas claramente mais baixos, a relação este ano “pode ser muito maior”, afirmou.
Os preços no mercado físico e futuro da soja e do milho não param de cair, com a iminência de uma grande colheita nos Estados Unidos no último trimestre deste ano.
Para negócios de soja a serem fechados no mês que vem, por exemplo, as cotações recuaram 21 por cento desde o final de maio, segundo a referência do contrato agosto na bolsa de Chicago. Para negócios fechados em novembro, em meio à nova safra dos EUA, os preços caíram mais de 15 por cento nos últimos 15 dias.
Os custos de produção no Brasil, por sua vez, não recuaram na mesma medida.
Desde janeiro, os custos para lavouras de soja e milho em Mato Grosso, principal Estado produtor, caíram 5 por cento entre janeiro e junho, disse na segunda-feira o Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea), favorecidos por um câmbio mais em conta para insumos importados.
NEGÓCIOS ANTECIPADOS
O problema de muitos produtores é que, embora boa parte dos insumos já tenham sido comprados –em patamares semelhantes aos de 2013– para o plantio que começa em setembro, os negócios de venda antecipada da soja seguem lentos.
Até o momento, 1,9 por cento da safra esperada em Mato Grosso foi comercializada, contra 27,7 por cento de comercialização antecipada um ano atrás, segundo o Imea.
“Esse produtor está correndo um risco muito grande”, disse Nelson Piccoli, o diretor administrativo da Aprosoja MT, associação que reúne agricultores de Mato Grosso.
“Os preços ficando nesse patamar, ele vai ter que colher muito bem para não ter prejuízo”, disse.
Segundo ele, a lucratividade do produto mato-grossense está garantida se a soja estiver cotada em Chicago em torno de 14 ou 15 dólares por bushel. Nesta terça, o primeiro contrato fechou a 11,81 dólares, menor cotação desde janeiro de 2012.
Andreassi, que é responsável pela compra de insumos para o plantio de 72 mil hectares, entre safras de verão e de inverno no sudoeste de Goiás, conta que nunca houve um ano como esse em termos de atraso nas vendas antecipadas de soja, o que atrapalha também os negócios com insumos.
“Ninguém ainda comercializou o grão do ano que vem… Sempre terminei minhas compras (de insumos), no mais tardar, no começo de maio. Esse ano, químicos ainda não fechei.”
Levantamento da consultoria Informa Economics FNP, relacionando o preço da soja e o dos fertilizantes em importantes polos agrícolas de seis Estados (MT, PR, RS, GO, SP e MG), ilustra a diferença entre a atual situação de mercado e do ano passado.
Em julho de 2013, para comprar uma tonelada de fertilizantes básicos eram necessárias 18,89 sacas de soja, a preços na data de entrega do produto. Atualmente, o fertilizante está 6 por cento mais barato, mas o preço obtido pela soja caiu 11 por cento. Assim, são necessárias agora 20,03 sacas de soja para comprar a mesma tonelada de fertilizantes.
PLANTIO
Apesar do cenário incerto sobre preços de venda da soja, o Brasil não deverá deixar de plantar uma área recorde da oleaginosa, porque os insumos necessários já estão comprados em sua maioria e porque o grão é a opção mais confiável dos agricultores para garantir renda.
“O produtor, independente, do preço da soja no mercado internacional, vai plantar a mesma área ou um pouco mais (em 2014/15), e com a mesma tecnologia”, disse Piccoli, da Aprosoja.
Na avaliação do diretor da Informa FNP, José Vicente Ferraz, as margens dos produtores de grãos vão continuar “razoáveis” após cerca de 10 anos com preços e rentabilidades em gerais muito boas.
“Vamos ter uma interrupção um pouco mais longa, de talvez dois anos, onde pode ter uma rentabilidade mais apertada, mas não será nenhuma catástrofe para produtores eficientes e profissionais”, disse o analista.