Os grandes frigoríficos brasileiros atravessam um 2010 movimentado pelo noticiário carregado do setor. Até o último fechamento, as ações da JBS, por exemplo, acumulavam perdas de 33,91% neste ano, marcando a nona maior perda dentre todos os ativos da BM&F Bovespa no período. Já os papéis da Marfrig mostravam baixa de 29,07%.
Por outro lado, Minerva e BR Foods somam valorizações de 8,06% e 10,02% neste ano, mas analistas ainda veem volatilidade até dezembro, principalmente por conta dos resultados do último trimestre deste ano, os quais devem ser impactados pelos preços maiores dos grãos e do boi no mercado doméstico.
A temporada de resultados do terceiro trimestre de 2010, em geral, mostrou números neutros para os frigoríficos brasileiros. Os maiores destaques nos balanços ficaram por conta dos números fortes no mercado interno, segundo analistas. De acordo com Rafael Cintra, da Link Investimentos, isso se deve ao cenário econômico “extremamente favorável ao consumo”.
Mas, mesmo com o cenário doméstico aquecido e as exportações em crescimento, os frigoríficos também estão sofrendo com depreciação do dólar e elevação dos custos, especialmente do boi e de grãos, sob a ótica de bancos e corretoras. Tais catalisadores devem se fazer perceber em meio aos resultados das companhias no último quarto deste ano.
Atenção aos preços dos grãos e dos bois – Um dos catalisadores que mais pesarão negativamente sobre os resultados dos frigoríficos no último trimestre do ano, segundo bancos e corretoras, são os preços do boi e dos grãos.
“Pelo lado dos custos, a política monetária expansionista nos Estados Unidos deve dar sustentação à continuidade de trajetória que temos presenciado nas cotações das commodities – soja e milho. Este será o ponto de atenção, entretanto o quarto trimestre do ano é sazonalmente mais forte para a BR Foods, existindo espaço para algum repasse de preços”, avaliou Mariana Peringer, do BB Investimentos, em relatório.
Já Pedro Herrera e Diego Maia, do HSBC, destacaram que estão “preocupados com a pressão nos custos decorrente dos maiores preços do gado e dos grãos”.
Preços lá fora sofrem com variação cambial – A forte valorização do real em relação ao dólar é outro ponto que levanta cautela entre os analistas. Segundo eles, a apreciação cambial já impactou negativamente o preço médio exercido pelas companhias no terceiro trimestre, e deve continuar pesando nos últimos três meses deste ano.
“Para o último trimestre de 2010, as margens no front de exportações poderão ser contraídas se os preços não subirem. Como observado nas estatísticas de outubro, os preços de exportação de gado fresco subiram modestos 0,5% em relação ao mês anterior, não suficiente para ofuscar os custos mais elevados dos grãos e o real mais forte, em nossa visão”, avaliam Fernando Ferreira e Isabella Simonato, do Bank of America Merrill Lynch, em relatório.
Nova legislação nos Estados Unidos – O governo norte-americano publicou no último dia 16 de novembro uma resolução na qual determina o fim das restrições às carnes bovinas e suínas brasileiras produzidas no estado de Santa Catarina. A nova lei passa a valer a partir de 1º de dezembro. “Nós acreditamos que a regra é positiva muito mais por conta do precedente que ela estabelece do que pelo impacto nos volumes de importação nos EUA vindos do Brasil”, avaliaram os analistas Gustavo Wigman e Claudio Lensing, do Goldman Sachs.
A equipe do banco explica que o reconhecimento de que uma política de prevenção à doenças no gado não necessariamente representa riscos é a maior vitória aos grandes países dentro deste setor, como o Brasil, onde certos tipos de doença provavelmente jamais serão erradicadas em algumas áreas isoladas, como a Amazônia.
“De acordo com o CME, o governo brasileiro espera que apenas um volume de 10 mil toneladas métricas de carne suína seja importado pelos Estados Unidos do Brasil no ano de 2011, o que representa menos que 0,05% dos 8,5 milhões de toneladas métricas de carne suína que serão consumidos na economia norte-americana no próximo ano”, disseram os analistas.
JBS: operações nos EUA em destaque – Segundo o relatório assinado pelos analistas Luis Miranda e Gabriel Vaz de Lima, do Banco Santander, a queda nas ações da JBS refletem um ano conturbado para a companhia, que teve de enfrentar problemas como a depreciação do dólar, elevação dos custos da ração e margens negativas na Argentina.
No entanto, os analistas enfatizam que os gastos foram pontuais e que não devem se repetir no próximo ano, viabilizando assim uma geração de caixa mais favorável. “Nós achamos que o mercado exagerou na reação a estas preocupações acima mencionadas, e nós vemos isto como uma oportunidade de ‘compra na fraqueza'”, disseram. O Santander reiterou a recomendação de compra para os papéis da JBS, estabelecendo preço-alvo de R$ 9,60 para o final de 2011.
O principal vetor que anima os analistas em relação aos próximos resultados da JBS são suas operações nos Estados Unidos. “A empresa está conseguindo sustentar margens operacionais saudáveis, apesar do cenário adverso de oferta de gado no Mercosul, graças às operações de suínos e aves nos EUA, fruto de sua estratégia de diversificação regional e de proteínas”, destacou Luciana Leocadio, da Ativa Corretora.
Marfrig deve ganhar sinergia de Keystone – Em relação ao Marfrig, o futuro ganho de sinergia da aquisição da Keystone segue no foco dos analistas. “A aquisição da Keystone adiciona fluxos de caixa estáveis através de sua grande exposição ao McDonald’s, ao passo que é beneficiada por uma taxa de crescimento médio anual da receita do McDonald’s de 8%”, argumentaram Herrera e Maia.
Além disso, Herrera e Maia destacaram que o modelo de negócios da Keystone está bem alinhado com a estratégia da Marfrig de diversificação geográfica e de proteínas. Neste sentido, o banco ressaltou que a escala e estabilidade dos fluxos de caixa da companhia adquirida deve contribuir para a taxa de crescimento média anual do Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) da Marfrig em 14% nos próximos três anos.
O HSBC acredita, porém, que o impacto positivo da aquisição da Keystone nas margens da JBS deverá ser sentido apenas a partir de meados de 2011. Neste sentido, o banco promoveu um corte em suas estimativas para a companhia neste e no próximo ano, preocupado, entre outras coisas, com as maiores despesas com juros das debêntures emitidas para a aquisição da Keystone.
“Estamos diminuindo drasticamente nossas estimativas de lucro líquido para 2010 e 2011. (…) Também ajustamos nossas expectativas de margem nas operações existentes da Marfrig em virtude do ambiente de maiores custos”, destacaram os analistas Pedro Herrera e Diego Maia. A nova projeção para os ganhos da empresa neste ano é de R$ 317 milhões (frente aos R$ 469 milhões estimados anteriormente) e R$ 390 milhões em 2011 (em comparação aos R$ 687 milhões da estimativa anterior).
Apesar do corte nas expectativas financeiras para a companhia, o HSBC se mostrou positivo em relação à aquisição da Keystone pela Marfrig. Para Herrera e Maia, a compra deste novo ativo reforça a análise do banco de que a companhia seja uma boa aposta de crescimento sólido no longo prazo. Por este motivo, o HSBC manteve sua recomendação de desempenho acima da média do mercado aos papéis da Marfrig.
Em relação aos resultados da companhia no terceiro trimestre deste ano, Carlos Albano, do Citigroup, enfatizou o desempenho das vendas líquidas, que cresceram 155% na comparação anual e 48% na base trimestral. “Por outro lado, as exportações foram fracas uma vez que aparentemente a companhia privilegiou o mercado doméstico”, disse.
O BB, por sua vez, ressaltou que pesaram negativamente nos resultados a volatilidade nos custos de aquisição do gado e o aumento de despesas operacionais em função de gastos extraordinários para a reestruturação das empresas adquiridas. “Para os próximos resultados, o desafio para a companhia é integrar as empresas recém adquiridas. Destacamos nossa expectativa de tendência de aumento na lucratividade em cada um dos segmentos com a captura de sinergias”, disse.
Na análise de Rafael Cintra, o balanço da empresa mostrou que o mercado interno brasileiro tem mostrado uma forte demanda por carne bovina, o que possibilitou a companhia a ter um expressivo aumento no volume e nos preços. “Esse resultado não deve aliviar as pressões nas ações, que devem continuar sofrendo no curto prazo”.
Brasil Foods mirando uma retomada? – De acordo com a analista Sandra Peres, da Coinvalores, a Brasil Foods reportou um bom desempenho no terceiro trimestre deste ano. Mesmo assim, a corretora destacou que, apesar da performance operacional e das margens muito fortes, o resultado final da empresa veio aquém do esperado.
“O mercado interno continua sendo o grande catalisador do bom desempenho, dado o cenário macroeconômico positivo e o repasse do aumento de preço em alguns produtos. No mercado externo, a empresa também vem apresentando melhoras em volumes, no entanto, os preços mantiveram-se estáveis em virtude da valorização cambial”, disse.
A sazonalidade do último trimestre deste ano deverá impactar positivamente os números da empresa nos três últimos meses de 2010, com o aumento do consumo de alimentos no mercado doméstico. “Vale destacar que a companhia continua reduzindo a sua alavancagem financeira e, além disso, está buscando absorver os ganhos de sinergia”.
Minerva se beneficia do mercado doméstico – Com o dólar mais fraco, os frigoríficos apresentaram fortes números no mercado interno. É o caso da Minerva. Segundo a Coin, a empresa aumentou seu market share no 3T10, mas teve como principal destaque em seu balanço o desempenho da divisão de carnes no front doméstico.
Mesmo assim, a analista Sandra Peres apontou vetores negativos. “Mesmo estando em um nível elevado, a utilização de suas plantas caiu fortemente ao longo do trimestre em função da menor disponibilidade de boi no mercado. Isso deve pressionar as margens do 4T10”, destacou a Link Investimentos.
Já o BB Investimentos espera que o preço do boi vivo deve permanecer pressionando as margens da empresa, mesmo que ela ainda continue a apresentar uma recuperação gradual nos negócios. Além disso, o BB ressaltou que, internamente, a demanda permanece aquecida, principalmente para o final do ano, trimestre sazonalmente mais forte.