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Brasil é o segundo país com maior número de projetos de créditos de carbono

<p>Atrás somente da Índia, o Brasil tem potencial para converter bilhões de dólares em receita mediante as negociações no mercado internacional de carbono.</p>

Redação (14/07/06) – Segundo o Ministério da Ciência e Tecnologia, o país já tem 160 projetos de Mecanismos de Desenvolvimento Limpo (MDL) São Paulo – O Brasil ocupa a segunda posição entre os países que desenvolvem projetos de negociação de créditos de carbono no mercado internacional, perdendo apenas para a Índia. Em setembro do ano passado, o Brasil era líder em número de projetos, com 87 propostas. Até o final de junho deste ano, a quantidade praticamente dobrou: são 160 projetos em diversas fases de aprovação, de acordo com o Ministério da Ciência e Tecnologia.

As negociações de créditos de carbono estão previstas pelo Protocolo de Quioto. Desde que entrou em vigor, em fevereiro de 2005, o tratado estabelece que países desenvolvidos e industrializados cumpram metas de redução de pelo menos 5,2% de emissões de gases nesta primeira fase de implementação que vai até 2012. Por outro lado, países em desenvolvimento – o Brasil se enquadra nessa categoria – não têm metas a serem cumpridas. Há mecanismos no Protocolo que permitem que países como o Brasil negociem créditos de emissão de carbono junto aos países poluidores com metas. Para isso, são criados projetos que se enquadrem no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), inseridos no Protocolo de Quioto.

Ao propor um projeto dentro dos moldes do MDL, os países ou empresas privadas têm como objetivo reduzir as emissões de gases causadores de efeito estufa (GEE) abaixo dos níveis que seriam registrados na ausência do projeto em questão. Quando conseguem baixar os níveis de emissões, eles ganham créditos, que são emitidos sob forma de Reduções Certificadas de Emissões (RCE) e podem ser usados para alcançar suas próprias metas de compromisso ou negociados no mercado de comércio do carbono.

O deputado federal Eron Bezerra (PCdoB-AM) afirma que, ideologicamente, é contra essa política de flexibilização das cotas de emissão do Protocolo de Quioto. “O principal inconveniente deste tipo de comércio é a transferência de responsabilidade, ou seja, os países poluidores podem considerar mais conveniente sujar e pagar alguém para limpar do que adotar mecanismos próprios de redução de GEE, evitando despesas com tecnologia limpa e perda de sua competitividade industrial”. Para o deputado, os países emissores não são penalizados pelas suas emissões e, em muitos casos, podem inclusive manter seus patamares de poluição se conseguirem negociar os créditos com outros países. Atualmente os maiores compradores de carbono são o Japão (38%) e o Reino Unido (15%). Mas Bezerra pondera ao afirmar que o mecanismo existe, e o Brasil dever ter sua compensação material caso consiga se incluir nesse cenário de negociações.

Segundo estimativas da empresa de consultoria ambiental Environmental Resources Management (ERM), o Brasil pode deixar de emitir até 130 milhões de toneladas de gases de efeito estufa até 2012. O índice pode ser convertido em receita para o país, atingindo bilhões de dólares. O sucesso disso depende, no entanto, da existência de políticas capazes de conduzirem a empreitada.

De acordo com Laércio Bruno Filho, consultor da ERM, até agora apenas seis projetos de MDL chegaram na fase final de aprovação e estão sendo implementados no mundo. O projeto brasileiro Nova Gerar, que trabalha para evitar a emissão de metano do aterro sanitário em Nova Iguaçu (RJ), negociado com a Holanda, é uma dessas experiências pioneiras. Nos próximos 21 anos, a expectativa é de que se produza 12MW de energia, evitando a emissão de 14 milhões de toneladas de gás metano.

Bruno acredita que o Brasil pode explorar os setores de aterros sanitários e transportes urbanos, além de negócios com empresas privadas. “As empresas emissoras estão vendo o carbono como oportunidade, não apenas para gerar receita, mas também pelo impacto na sua imagem e reputação. O carbono é um dos pilares para a sustentabilidade”, diz Potencial amazônico.

De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), o Brasil emite 265 milhões de toneladas de carbono a cada ano, sendo 200 milhões pelo desmatamento e os 65 milhões restantes pela queima de combustível fóssil. As estimativas do Inpa são de que um hectare de floresta seqüestra uma tonelada por ano de carbono. A Amazônia tem 300 milhões de hectares de floresta, capazes de sequestrar 300 milhões de toneladas de carbono. Por ano, calcula-se que haja uma média de desmatamento de dois milhões de hectares, que são responsáveis por produzir 200 milhões de toneladas de gás carbônico. O saldo em créditos, portanto, seria de 100 milhões de toneladas de carbono por ano. Cada 100 milhões de toneladas de carbono vale entre cinco e 10 dólares. A receita gerada para o país variaria de 500 milhões a um bilhão de dólares. O consultor da ERM explica que quando um projeto chega a sua fase final de aprovação, os créditos de carbono conferidos a ele valorizam muito, chegando a mais de 20 dólares.

Eron Bezerra acredita que a Amazônia é um potencial nesse mercado só pelo fato de absorver carbono. Contudo, o deputado afirma que a utilização da Amazônia para os negócios do carbono só é possível se a floresta for preservada. “Se não houver desenvolvimento econômico na região, a pressão cairá sobre a floresta”, afirma. Para ele, é importante que haja consciência de que a floresta tem um valor econômico. A partir dessa premissa, ele acredita que ela possa ser conservada.

“Quem preserva, passaria a ganhar dinheiro”. Bezerra defende que haja uma política de Estado para inverter a lógica do ganho econômico. Para o deputado, a Amazônia ainda perderá as suas florestas para serem substituídas pelo agronegócio, como a soja, enquanto a regra do mercado apontar esse tipo de atividade como sendo a mais lucrativa e atrativa.

“Ainda é pouco” Apesar de o Brasil ser um dos países com mais projetos de MDL, a pesquisadora Daniela Bartholomeu, da Escola Superior Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, acredita que ainda é pouco. “Há muita coisa que pode ser feita nos setores de indústria, agrícola e agropecuária. Dá para expandir mais, mas há pouca informação disseminada sobre os créditos de carbono, valores ou como elaborar um projeto”, afirma. Para a pesquisadora, a responsabilidade de difusão de conhecimento deve partir de uma política pública de Estado, mas também deve vir por parte de universidades e centros de pesquisa.

Um dos entraves que impedem o Brasil de tirar proveito de suas florestas no mercado de carbono é a conservação florestal não estar incluída como política de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo. “O setor florestal é problemático. Não tem definição clara”, afirma Bartholomeu. A pesquisadora da Esalq lembra que, até hoje, não existe nenhum projeto de MDL voltado para a Amazônia.

Conservação florestal Antônio Donato Nobre, pesquisador do departamento de Botânica do Inpa, explica que o fato de o Brasil ter uma floresta que seqüestra toneladas de carbono, removendo o gás da atmosfera como um filtro, não conta em nada no cenário do Protocolo de Quioto. Ele explica que as florestas são importantes por estocarem e seqüestrarem o carbono da atmosfera. Segundo Nobre, a exclusão da conservação ambiental no MDL se deve à posição que o próprio Brasil, além da Malásia e de organizações ambientalistas não-governamentais, como o Greenpeace e WWF, teve quando se definiram as orientações do Mecanismo.

O pesquisador do Inpa lembra que esses setores acreditavam que as florestas seriam utilizadas pelos países emissores para se escusarem dos deveres de reduzirem as suas metas estabelecidas de redução de GEE. Contudo, Nobre afirma que “só o desmatamento já mata os objetivos do Protocolo de Quioto” e explica que, se não forem contidos, os níveis de emissões de gás carbônico produzidos podem aniquilar as tentativas de redução de GEE estabelecidas por Quioto até 2012.

Recentemente, setores da sociedade civil, pesquisadores e ONGs desenvolveram uma proposta para incluir a questão da conservação florestal em MDL. A proposta, conhecida como linha de desmatamento evitado, tem como meta a preservação 20 mil km2 por ano, reduzindo 4,5% das emissões de carbono. Essa redução seria, então, paga pelos países poluidores. Segundo Nobre, essa política seria a mais viável e compatível para que a Amazônia pudesse ser incluída nesse mercado dos créditos de carbono.