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Genética

Inseminação artificial em suínos: o início de um projeto inovador no Brasil nos anos 70

Ainda quando a técnica era apenas usada em bovinos, ABCS, MAPA, ACSURS, UFRGS e Embrapa se uniram para melhorar e aperfeiçoar o rebanho brasileiro, disponibilizando uma tecnologia genética de ponta

Inseminação artificial em suínos: o início de um projeto inovador no Brasil nos anos 70

Recentemente duas personalidades importantes foram premiadas e reconhecidas pelos seus trabalhos na suinocultura, Isabel Regina Scheid e Werner Meincke. Eles foram prestigiados no aniversário de 50 anos da ACSURS que ocorreu em 24 de novembro de 2022 por terem sido pioneiros no desenvolvimento de Inseminação Artificial (IA) no Brasil. Na ocasião, a associação agradeceu o trabalho prestado e homenageou os dois pelo pioneirismo na inseminação artificial em suínos que colaborou com o aperfeiçoamento e evolução do setor. 

O programa foi uma ideia do então presidente da Associação Brasileira de Criadores de Suínos (ABCS), Hélio Miguel de Rose, que contou com o apoio do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), a Associação de Criadores de Suínos do Rio Grande do Sul (ACSURS), Associação Catarinense de Suínos (ACCS), Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). A ABCS conversou com Scheid e Meincke para conhecer essa história de sucesso do setor.

Pioneirismo nacional

Isabel e Werner foram integrados ao projeto muito cedo, basicamente quando ele começou. Os dois eram recém formados e com as técnicas aprendidas na Europa, começaram a compartilhar e aplicá-las em um projeto de implantação da IA em suínos no Vale do Taquari. Na época, a ACCS já fazia algo semelhante em Concórdia (SC). Meincke contou como começou o seu trabalho na IA em suínos, já que na época o método só era feito em bovinos. 

“Permaneci um ano na ABCS como inspetor zootécnico e ao mesmo tempo me preparando, fiz uma imersão em inglês para depois ir para a Holanda, buscar a tecnologia para o Brasil. Fiquei 90 dias na maior central de inseminação de suínos da Holanda e lá iniciei os trabalhos. Me envolvi na alimentação dos animais e depois na parte laboratorial de avaliação de sêmen, coleta e por final o trabalho era inseminar setecentas fêmeas em campo para ver e avaliar os resultados. Findado esse período eu retornei ao Brasil, mas logo em seguida fui para Alemanha para aprofundar os conhecimentos em reprodução de suínos. Naquela oportunidade quem deu sequência aos trabalhos foi a doutora Isabel que ficou trabalhando um bom tempo conosco na implantação dessa tecnologia”, explica. 

De acordo com o presidente da ACSURS, Valdecir Luis Folador, a entidade teve um papel importante no desenvolvimento da tecnologia no Brasil e do setor. “A ACSURS foi pioneira justamente por ter uma visão bastante adiantada: ao tempo desses profissionais, da própria entidade, da sua direção e do seu presidente. Olhou a necessidade de buscar esse desenvolvimento através da central de produção de sêmen, com o melhoramento genético sendo mais rápido e eficiente. Além disso, tinha esse pessoal com o conhecimento, já que lá fora, na Europa principalmente, isso já acontecia e estava mais avançado porque no Brasil não existia ainda essa tecnologia, não tinha ninguém praticando no setor”, explicou.

Jornada revolucionária

A partir deste ponto, as duas divisões foram definidas, uma focada em obter o conhecimento e a outra em montar a estrutura necessária. Após ter tudo o que era necessário, o trabalho iniciou no Brasil com muita determinação dos envolvidos. “A Central, localizada junto à sede da ABCS e ACSURS, em Estrela (RS), recebeu equipamento básico de laboratório. Montou-se um manequim rudimentar, machos foram adquiridos e treinados, e começamos o nosso próprio treinamento em coletas, análise e conservação de sêmen. Logo iniciou-se o programa a campo, com as primeiras inseminações sendo realizadas ainda em 1975”, contou Isabel.

“Nós iniciamos de uma forma bastante pequena. Sem grandes investimentos porque nós estávamos em dúvida em relação a recepção da tecnologia e os reais resultados que a gente conseguiria em campo. Então colocamos um um pequeno laboratório junto ao Parque 20 de Maio, que fica nos fundos da ABCS em Estrela (RS) e lá, então, alojamos os primeiros reprodutores. Iniciamos os trabalhos em campo naquele momento nós mesmo. Nos deslocávamos para atender aos produtores que solicitavam esse trabalho diretamente junto à associação”, explicou Werner. 

Do passado ao presente

Na década de 80 empresas de melhoramento genético chegaram ao Brasil, assim, viabilizando a técnica de vez. “Por outro lado, o fato do Brasil já ter uma década de experiência em campo e uma comunidade técnico-científica familiarizada com a IA foi uma situação claramente vantajosa para o setor naquele momento. Rapidamente viabilizou, entre outros, o manejo reprodutivo em unidades de produção com grande número de matrizes, otimizou o melhoramento genético e passou a ter papel importante nas questões de segurança sanitária do setor. Implantaram-se programas internos nas granjas, houve avanço significativo no domínio da técnica, passamos a dispor de uma cadeia de produção e fornecimento de insumos, desenvolveram-se novas alternativas para o transporte do sêmen. Eu vejo muita coerência no crescimento da IA e do setor, uma não aconteceria sem a outra”, afirma Scheid.

“Então veja a diferença de quando iniciamos e como hoje esses programas estão sendo conduzidos. É uma satisfação e alegria muito grande que a gente tem de ter tido a oportunidade de acompanhar toda essa evolução durante esses 50 anos. É realmente uma coisa fantástica o que aconteceu e hoje nós temos, inclusive, projetos em andamento que preveem a distribuição de sêmen através de drones. Imagina só, saindo lá do transporte via ônibus e hoje já se fala em distribuição via drone. Então é algo extraordinário, algo fantástico”, comemora Meincke. 

Para o presidente da ACSURS, o trabalho da entidade junto a esses profissionais foi essencial para o resultado que o Brasil tem hoje com a suinocultura, tanto em solo brasileiro quanto no exterior. “Nos anos 70, isso sem dúvida alguma, foi um marco que foi plantado pela entidade e isso tem reflexos no desenvolvimento da suinocultura gaúcha e brasileira até hoje. E isso graças ao início da busca dessa tecnologia, que já era usada na Europa. É importante destacar o pioneirismo da ACSURS e dos profissionais. E hoje a suinocultura, a forma como ela está moderna, a evolução que tivemos na genética, principalmente a partir de meados dos anos 80 e 90, intensificou ainda mais essa evolução. Na década de 2000 nem se fala, né? A suinocultura se transformou da água para o vinho”, conclui Folador.

Presença feminina forte na suinocultura

A presença de mulheres no agro brasileiro sempre existiu, apesar de ser em menor quantidade e, antigamente, sem espaço de liderança e até mesmo visibilidade. Mas foi justamente na suinocultura que Isabel Scheid encontrou espaço para desenvolver seu trabalho sem discriminação ou dúvidas sobre a sua capacidade. 

“O maior desafio era a implantação e condução do programa de IA com êxito, e não tive a noção de que ser mulher poderia fazer alguma diferença. Sentia-me igual aos colegas homens na atividade profissional, e sempre encontrei receptividade e respeito entre os produtores. Na medida que os resultados da IA apareciam, firmava-se a vantagem da adoção da técnica – independente se conduzida por homem ou mulher. Eu percebia sim alguma curiosidade em ver uma mulher trabalhando nessa área, mas não via preconceito. Pelo contrário, encontrava algum grau de empatia”, declarou.