A quebra da safra agrícola nos Estados Unidos colocou o mundo em estado de alerta. Afetados pela pior seca dos últimos 50 anos, a produtividade das principais lavouras norte-americanas deve despencar. Segundo o último relatório do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), a previsão para a produção de milho nesta safra é de 329 milhões de toneladas, nada menos do que 51 milhões de toneladas abaixo da previsão inicial, que era de uma colheita de 380 milhões de toneladas do cereal. A estimativa para a produção norte-americana de soja também está sendo revista para baixo. O USDA aponta uma produção de 83 milhões de toneladas, ante uma previsão inicial de 90 milhões de toneladas.
Para o economista e engenheiro agrônomo Alexandre Mendonça de Barros, a acentuada queda na produção agrícola dos EUA – país responsável pelo maior excedente agrícola mundial – deve reduzir os já apertados estoques mundiais de grãos a níveis mínimos. “Os impactos da quebra da safra nos Estados Unidos vão ser grandes. Serão necessárias pelo menos duas safras para recompor os estoques mundiais”, afirma. De acordo com o economista, o cenário é preocupante e requer atenção do produtor de proteína animal. “O produtor precisa ficar atento, pois tudo indica que teremos um quadro muito desconfortável em termos de custo de ração para os próximos anos”, adverte.
Alexandre Mendonça de Barros é um dos palestrantes do 10º Seminário Internacional Agroceres PIC de Suinocultura, que acontece de 29 a 31 de agosto no Guarujá (SP). Dada a complexidade e incertezas do cenário atual, Mendonça de Barros responde por uma das palestras mais esperadas do evento. Na entrevista a seguir, o economista fala sobre os impactos que a quebra da safra nos Estados Unidos vai trazer ao mercado internacional de grãos, faz projeções para o abastecimento e preços do milho e soja em curto e médio prazo no Brasil, analisa a crise que castiga a suinocultura brasileira e aponta perspectivas para o setor. Confira.
As recentes quebras de safra nos principais países produtores de grãos e a seca que atualmente castiga as plantações nos Estados Unidos têm gerado grande preocupação já que devem reduzir fortemente a oferta de grãos no mercado mundial. Que análise o senhor faz dessa situação?
Mendonça de Barros – Vivemos um quadro de aperto de oferta de grãos, que é estrutural, nos últimos sete anos. Esse cenário só não foi mais radical porque não assistimos nas últimas quatro ou cinco safras nenhuma quebra extraordinariamente grande no mundo. Hoje, porém, estamos vendo pela primeira vez uma quebra muito relevante nos EUA. Os números do último relatório do USDA [Departamento de Agricultura dos Estados Unidos] apontam uma safra de milho da ordem de 329 milhões de toneladas. A expectativa inicial do USDA era de uma safra de cerca de 380 milhões de toneladas de milho. As previsões para soja também estão sendo revistas para baixo. O USDA apontava inicialmente uma safra de 90 milhões de toneladas. Em seu último relatório, no entanto, a previsão é de uma colheita de 83 milhões de toneladas. Considero essas previsões até otimistas. Muito provavelmente veremos números de safra ainda piores nos EUA. Ao mesmo tempo, o clima no leste europeu não está nada bom. A safra de trigo prevista em países como Rússia, Ucrânia e Cazaquistão será menor. Na Ucrânia, que se tornou um importante exportador de milho, a safra do cereal não vai bem. É óbvio que tudo isso tem pouca representatividade frente ao que está acontecendo com a safra norte-americana. Porém, neste momento, qualquer quebra adicional traz mais problemas para o mercado internacional de grãos.
O senhor falou que os números do USDA são otimistas. Em sua opinião qual estimativa para as safras de milho e soja nos EUA neste ano?
Mendonça de Barros – Acredito que a safra norte-americana de milho vem abaixo de 300 milhões de toneladas e a de soja abaixo de 80 milhões de toneladas.
Caso esse cenário se confirme, quais os impactos para o mercado internacional de grãos?
Mendonça de Barros – As perdas serão grandes nos EUA, tanto de milho quanto de soja. A quebra de safra norte-americana de milho pode ser a maior desde 1988. Isso traz impactos muito grandes. Serão necessárias pelo menos duas safras para recompor os estoques mundiais. Mesmo que tudo ande bem na América do Sul e nos EUA no ano que vem, será necessário mais um ano para conseguir trazer os estoques para os patamares do início de 2012. O cenário é realmente preocupante. Trata-se de um quadro muito desconfortável em termos de custo de ração para os próximos anos. É claro que essa situação tende a melhorar no Brasil a partir de março, período de colheita de soja, cuja safra deve ser muito boa, se o clima permitir. Em tese, a oferta de soja, que está muito apertada no Brasil até o final do ano, melhora em 2013. Com isso, o preço do farelo deve se acomodar, embora em patamares elevados.
Diante desse quadro, como o senhor analisa as perspectivas de abastecimento e preço para milho e soja no Brasil no curto prazo?
Mendonça de Barros – No caso do milho temos uma oferta mais tranquila para passar este ano e o começo de 2013. Mesmo com uma oferta mais confortável, no entanto, os preços do milho vão se manter em patamares elevados. Não vejo problemas de abastecimento de milho. Já no caso da soja a situação é mais complicada. O mercado está tão apertado, por conta da quebra de safra que aconteceu neste ano, que vai ser difícil conseguir manter soja para esmagar até o final do ano. Isso significa que o preço do farelo vai manter-se em níveis elevadíssimos até fevereiro/março, período de colheita da oleaginosa.
Depois de um período de lucratividade, a suinocultura brasileira atravessa novamente um momento difícil. Que leitura o senhor faz dessa situação?
Mendonça de Barros – A suinocultura brasileira realmente vive um momento muito difícil. A combinação de alguns fatores explica essa situação. A questão principal, sem dúvida, é o custo elevado dos grãos. Um segundo elemento é o aumento da produtividade de nossa suinocultura. O abate de suínos está crescendo no Brasil. Nesse cenário de maior oferta seria necessário ampliar o mercado consumidor. Contávamos com o avanço das exportações. Mas, lamentavelmente, a queda dos embarques para a Rússia, embora compensadas pelo aumento do envio para outros destinos, mantém as exportações do setor suinícola no patamar das 500 mil toneladas por ano. Não há dinamismo no comércio da carne suína brasileira no mercado internacional, apesar do enorme potencial de exportação do setor. Já no mercado interno, embora venha crescendo, o consumo per capita ainda é baixo. A combinação entre o excesso de oferta de carne suína e o alto preço dos insumos de alimentação pressiona para baixo as margens dos produtores, que nos momentos mais agudos passou a se desfazer das matrizes. Esse recurso acelera a oferta de carne e derruba ainda mais os preços. Tudo isso gera um desequilíbrio muito forte na cadeia produtiva.
O desempenho do setor suinícola é historicamente melhor no segundo semestre. O senhor acredita na retomada dos preços?
Mendonça de Barros – Os preços vão ter que retomar na medida em que o setor está cortando muito a oferta com o abate de matrizes. Em algum momento a oferta diminuirá. O problema é que esse ajuste leva tempo no caso da suinocultura. O produtor acaba sofrendo quase um ano até que o setor ajuste a oferta à demanda e os preços internos voltem a se recuperar.
Como o senhor analisa as medidas adotadas pelo governo brasileiro para ajudar o setor?
Mendonça de Barros – A ajuda chegou muito tarde. Essa era uma crise anunciada. O setor vem sofrendo há muitos meses. Lamentavelmente a operação do governo foi lenta demais, fraca demais, tardia demais. Está se tentando corrigir agora um desvio que já vem lá de trás. A safra no Paraná quebrou e os custos já vinham altos desde o início do ano. O setor vinha com margens pressionadas e acho que o apoio chega muito tarde. É evidente que é melhor ter algum apoio que não ter apoio nenhum. É louvável que esse auxílio ocorra, é preciso que ele ocorra, a suinocultura brasileira tem um potencial enorme no futuro, mas é lamentável o timing do governo brasileiro. As políticas de auxílio chegaram tarde demais. Tudo o que vem sendo feito hoje teria que vir sendo feito a quatro meses atrás.
Que perspectivas o senhor vislumbra para o setor em curto e médio prazo?
Mendonça de Barros – No curto prazo a situação da suinocultura permanecerá muito difícil. No médio prazo, porém, o setor tem um futuro promissor. Acredito piamente que o mercado internacional vai se abrir para o Brasil. Países como o Japão, Coreia do Sul, México vão abrir seus mercados à carne suína brasileira. No mercado interno, se o setor fizer um bom trabalho de marketing, o consumo pode avançar. Já há um processo de mudança da percepção do consumidor brasileiro em relação à carne suína. Acredito sinceramente que em médio prazo a suinocultura brasileira vai reencontrar sua trajetória de crescimento. Mas no curto prazo a situação do setor é muito preocupante e não vejo muito alívio para o produtor no curto prazo.
Para finalizar, quais suas expectativas sobre sua participação no 10º Seminário Internacional Agroceres PIC de Suinocultura?
Mendonça de Barros – As melhores possíveis. O Seminário será uma ótima oportunidade para discutirmos todas essas questões com mais profundidade. Durante minha apresentação vou falar sobre o cenário macroeconômico mundial, sobre o mercado de grãos e de carnes, trazendo dados e informações atualizados e espero grande interação com os participantes do evento.
Serviço
10º Seminário Internacional Agroceres PIC de Suinocultura
Data: 29 a 31 de agosto de 2012
Local: Sofitel Jequitimar – Guarujá (SP)
Realização: Agroceres PIC
Informações
Telefone: (19) 3526-8605, com Gabriela Beloto
E-mail: [email protected]
Site: www.agrocerespic.com.br