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Carne Bovina

Piora perfil das exportações de carne bovina

País perdeu um mercado de preços mais altos e cortes mais nobres e avançou num mais instável e que demanda produtos de menor valor.

Em dez anos, a União Europeia saiu da posição de principal mercado para a carne bovina brasileira para um posto mais modesto, apenas o terceiro lugar. Nesse período, a emergente Rússia, que nem aparecia no ranking dos principais mercados tornou-se a primeira compradora de carne bovina do país sem considerar a região do Oriente Médio e Norte da África. O saldo dessa mudança é negativo: o país perdeu um mercado de preços mais altos e cortes mais nobres e avançou num mais instável e que demanda produtos de menor valor.

No já longínquo ano 2000, o Brasil exportou US$ 511 milhões em carne bovina para a União Europeia, uma fatia de 61% das exportações totais daquele ano, de US$ 837,2 milhões. No último ano, a participação foi bem menor, apesar do valor ter crescido: US$ 712 milhões, ou 14,5% de um total de US$ 4,886 bilhões, de acordo com dados da Associação Brasileira da Indústria Exportadora de Carnes (Abiec).

A Rússia, em 2000, ainda nem comprava do Brasil. No ano passado, importou US$ 1,073 bilhão, ou 21,97% da receita total proveniente das exportações de carne bovina, de US$ 4,886 bilhões, de acordo com a Abiec.
 
A derrocada das vendas para a União Europeia começou em 2008, quando o bloco determinou que compraria carne bovina apenas proveniente de animais rastreados de uma lista restrita de fazendas do Brasil. Na época, havia 15,5 mil fazendas aptas a fornecer animais. Com as restrições, caiu a 2,2 mil atualmente o número de propriedades habilitadas, segundo Antônio Camardelli, presidente da Abiec.

Para ele, ao restringir as fazendas a UE criou um mecanismo para reduzir os volumes exportados pelo Brasil, numa tentativa de atender ao clamor de produtores locais. Segundo a Abiec, o bloco comprou 125,3 mil toneladas de carne bovina do Brasil no ano passado, bem abaixo das 308,4 mil toneladas de 2007, antes das restrições. “O Brasil depende da União Europeia porque não tem alternativa [de mercados] para vender aos preços que a UE paga”, admite Camardelli. Segundo ele, os mesmos cortes que a UE compra têm preços 50% inferiores em mercados do Oriente Médio, por exemplo.

De janeiro a julho deste ano, o preço médio da carne vendida à União Europeia ficou em US$ 7.369 por tonelada. O preço médio das exportações totais ficou em US$ 4.789 por tonelada. Nas vendas à Rússia, o valor médio no período foi US$ 4.488, conforme a Abiec.

“Só vamos equacionar esse problema no momento em que abrirmos mercados como o Japão, Coreia do Sul e Taiwan, que também consomem cortes mais caros”, avalia o dirigente. O problema, lembra, é que esses países só compram carne bovina de países livres de aftosa sem vacinação. O Brasil tem o status de livre de aftosa com vacinação – apenas Santa Catarina é considerado livre sem vacinação. “É um problema difícil de resolver”, lamenta.

Na avaliação do executivo, a indefinição no acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul aumenta a pressão sobre o Brasil porque o bloco europeu voltou a exportar carne bovina.

Um especialista da indústria brasileira acrescenta que a ausência do produto brasileiro na UE – por causa das restrições – acabou elevando preços e intimidando a demanda europeia, ainda mais num momento de crise financeira na região.

Do lado da oferta, também há pouco estímulo no Brasil para investir no rastreamento e habilitação para exportar à UE, apesar do prêmio entre 2% e 8% sobre a arroba do boi pago pelos frigoríficos aos pecuaristas. “A legislação para exportar [à UE] é muito amarrada”, diz. Ele observa que é difícil cumprir os requisitos europeus no caso dos animais criados a pasto. “O controle é mais difícil em áreas extensas”.

Isso é menos complicado no caso dos confinamentos. No entanto, há outro problema: os animais saem da engorda intensiva entre agosto e novembro enquanto o pico da demanda da UE ocorre entre fevereiro e julho.

A menor participação da UE nas vendas totais de carne bovina também reflete uma legislação mais restrita para as exportações de cortes nobres dentro da chamada Cota Hilton, cujo volume é de 10 mil toneladas. Desde 2009, a UE definiu que os cortes vendidos dentro da cota devem ser provenientes apenas de animais rastreados desde a desmama (10 meses de vida) e que sejam alimentados só a pasto, sem nenhum tipo de suplementação a partir de então. A Abiec já informou que pretende questionar a medida na Organização Mundial de Comércio (OMC).

Por conta da exigência, o Brasil só conseguiu exportar 4,3% do volume no ano-cota iniciado em julho de 2010 e encerrado em junho deste ano. Ao não cumprir a cota, o Brasil deixa de ser beneficiado pelo prêmio que a Hilton embute em relação às exportações de carne bovina fora da cota. Na Hilton, a tarifa de importação é de 20% ad valorem. Fora da cota, o imposto é de 12,8% mais € 3.041 por tonelada.

Assim como a UE, a Rússia também tem dado dor de cabeça aos exportadores brasileiros. Atualmente, restringe a importação de carnes em geral (incluindo carne bovina), de mais de uma centena de estabelecimentos exportadores nacionais, alegando problemas sanitários.

Não é a primeira vez que o país embarga produto nacional – e talvez não seja a última. Mas, diz uma analista, depois de entrar na OMC, a expectativa é de que a Rússia fique menos “irracional”. Apesar de os russos negarem, a percepção no Brasil é de que restrições são uma forma de pressionar por mais apoio à entrada na OMC.

Diferentemente da UE, a Rússia compra do Brasil principalmente os cortes de segunda, de menor valor. Questionado sobre a instabilidade russa, Camardelli, da Abiec, diz que “a Rússia é e sempre será importante ” para o Brasil. E observa que o país busca autossuficiência em carnes suínas e de frango, mas não em bovinos. Assim, segue necessitando do produto brasileiro.