Defendo a tese de que a recente queda significativa do desmatamento na Amazônia se deveu, pela ordem, aos fatores: 1) fiscalização; 2) pactos com setores privados; 3) estímulos ao desenvolvimento sustentável. E que a meta ideal a ser alcançada é a inversão da ordem desses fatores.
Em 2009 (agosto de 2008 a julho de 2009), reduzimos o desmatamento para a menor taxa da história, 7 mil Km2, metade do ano anterior e 1/3 da média da década. Entre agosto de 2009 e fevereiro de 2010, houve nova queda de 50%. Alcançaremos o compromisso de redução do desmatamento em 80% que o presidente Lula anunciou em Copenhague, antes de 2020 – provavelmente em 2014. Triplicamos a fiscalização do Ibama, da Polícia Federal e da Força Nacional, através da Coordenação Interministerial de Combate ao Crime Ambiental. O grileiro não pagava terra, imposto e multa, nem assinava carteira. Com o Decreto de Crimes Ambientais, apreendemos o boi pirata, a madeira e o carvão ilegais, os leiloamos e doamos o resultado ao Bolsa Família. O crime ambiental deixou de compensar. Participamos de 30 operações, destruindo fornos de carvão e retirando o boi pirata de terras indígenas e de parques nacionais.
A Moratória da Soja, com os exportadores de óleo vegetal e cereais, estipulou que esses não comprariam soja de área desmatada após 2006. O monitoramento constatou que o acordo foi cumprido em 95%. A soja deixou de ser fator do desmatamento da Amazônia. Assinamos o Pacto da Madeira Legal com os exportadores; foi acordado o aumento da oferta da madeira de manejo sustentável; subscrevemos o Acordo do Minério Legal com a Vale; com os bancos públicos e privados, firmamos o Protocolo Verde do Crédito, que veda financiamentos a atividades predatórias. Com a Associação Brasileira de Supermercados, firmamos o Acordo da Carne Sustentável; até o fim de 2010, será retirada das prateleiras carne originada do desmatamento. É o consumo consciente entrando no jogo, levando à mudança de postura das empresas.
Os mecanismos de financiamento, indução aos modelos tecnológicos e de organização territorial são mais recentes e promissores. Concluímos em março de 2010 o Macrozoneamento Econômico-Ecológico (ZEE) da Amazônia. Este estabelece nove zonas na Amazônia, com vocações como: preservação do coração central, contenção das frentes de expansão, recuperação das áreas degradadas, mineração e portos, manejo florestal e ecoturismo. Não haverá financiamento para atividade em desacordo com o Macro ZEE. O Fundo Amazônia é estratégico. Seu conselho é composto pela SBPC, seringueiros, CNI (indústria), governos estaduais e federal, e gerido pelo BNDES. Da Noruega, obtivemos uma doação de um bilhão de dólares; os projetos financiados são de monitoramento e fiscalização, ciência e tecnologia, unidades de conservação e extrativismo, pagamento por serviços ambientais. Vinte projetos foram aprovados e dezenas estão em análise. O presidente Lula decretou preços de garantia para dez produtos extrativistas, como borracha, castanha, açaí, pequi etc., possibilitando que centenas de milhares de extrativistas tenham vida digna convivendo com a floresta em pé. A Operação Arco Verde foi lançada com dez ministérios, nos 43 municípios responsáveis por 55% do desmatamento da Amazônia. Fornecimento de crédito pelo BB e Basa, piscicultura para o peixe amazônico ser consumido e exportado em alternativa ao boi pirata, técnicas da Embrapa para agricultura de bom rendimento e baixo impacto, regularização fundiária. Os municípios começam a sair da lista dos desmatadores e competem por créditos de carbono. Esse caminho substituirá as operações em curso, como a Corcel Negro e a Delta, de combate ao carvão e à madeira ilegais.
O desafio será estender essas ações ao Cerrado, à Caatinga e à Mata Atlântica, biomas que são mais agredidos do que a Amazônia. O Cerrado abriga as nascentes das principais bacias hidrográficas. O Nordeste será a região brasileira mais afetada pelas mudanças do clima. Antes só monitorávamos a Amazônia, hoje todos os biomas. O Brasil não é um samba de uma nota só. E nas metrópoles, onde vive a maior parte da população, o desafio é a ecologia urbana: água, lixo, esgoto, qualidade do ar e encostas.
*CARLOS MINC é deputado estadual (PT-RJ) e foi ministro de Meio Ambiente.