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Economia

O peso da carne

Se Mantega fosse prontamente atendido em sua proposta de expurgar a alta dos alimentos e dos combustíveis, inflação seria menor.

O peso da carne

Se o ministro da Fazenda, Guido Mantega, fosse prontamente atendido em sua proposta de expurgar a alta dos alimentos e dos combustíveis das estatísticas usadas pelo Banco Central para definir sua política de juros, a inflação do ano até novembro teria ficado 0,58 ponto porcentual mais baixa apenas com a exclusão da disparada dos preços da carne bovina. Ou seja, teria sido de 5,05% e não de 5,63%.

O consumidor, que vai providenciar uma ceia mais farta neste Natal, pagará pelo quilo da picanha ou do filé mignon quase duas vezes o que terá de desembolsar pelo de bacalhau; cinco vezes mais do que pelo da calabresa; ou seis vezes mais do que lhe sairá o peru.

Em 2010, os preços do boi gordo negociados na Bolsa subiram 36,3%, conforme aponta o índice Esalq/BMF&Bovespa.; O pico dessa trajetória aconteceu no dia 11 de novembro quando a arroba atingiu R$ 117,18. De lá para cá, as cotações cederam alguma coisa e, em seguida, se recuperaram um pouco. Ontem, fecharam a R$ 105,03.

Com esse salto, o ministro não pode seguir argumentando que se trata somente de choque de oferta, ou seja, de repentina escassez provocada por catástrofes naturais. A esticada dos preços não é (também) apenas efeito do excessivo descarte de matrizes pelos pecuaristas, ocorrido em 2005 e 2006, em consequência de período prolongado de cotações baixas.

Os levantamentos do IBGE mostram que, em 2007, o rebanho de bovinos caiu 3% em relação ao ano anterior, para 205 milhões de cabeças, o que dava um pouco mais do que um boi para cada brasileiro. Foi um período em que os empresários da engorda abandonaram práticas que exigem mais dispêndio (embora tragam retorno maior), como o confinamento.

De lá para cá, os plantéis vêm se recuperando, mas insuficientemente em relação às necessidades do consumo interno e das exportações. Os abates aumentaram 7,1% (até setembro) e as exportações, 30,6% (até novembro).

O principal fator responsável pela alta da carne tem a ver com o forte aumento do consumo, que, por sua vez, tem a explicação que o ministro Mantega não gosta de ouvir: deve-se ao excessivo aumento das despesas públicas (mais de 15%).

É claro que o fator crédito, que aumentou 20,3% em 12 meses, também não pode ser descartado, porque, ao levantar financiamentos, o consumidor teve mais dinheiro na mão, o que permitiu incrementar o consumo de proteína animal, seja à mesa com a família ou no churrasquinho domingueiro com os amigos.

Esse assunto não morre no orçamento doméstico. Mexe com uma questão mais acalorada, que é a política de juros. Como ficou dito acima, apenas a alta da carne até novembro contribuiu com quase 0,6 ponto porcentual para a evolução do IPCA, o medidor da inflação que tem de ser levado em conta pelo Banco Central.

Carne bovina não é como roupa ou aparelho doméstico cujos preços, passada a temporada de vendas, desabam porque o varejo promove liquidações. As perspectivas são de que, em 2011, os preços da arroba do boi gordo continuem altos e só comecem a ceder a partir do segundo semestre de 2012, quando a atual animação dos pecuaristas tiver aprontado mais garrotes para o abate.

As cotações das commodities continuam em alta, como aponta o gráfico da evolução do índice CRB.

Recuperação à vista

Até algumas semanas atrás essa alta apenas refletia o bom desempenho dos emergentes, especialmente da Ásia, fortes compradores de matérias-primas metálicas e de alimentos. Mas começa também a mostrar a recuperação das economias dos países ricos. Reforçam-se agora as apostas de que, a partir do segundo trimestre de 2011, o consumo e o sistema produtivo dos Estados Unidos já terão decolado.