O Brasil está em uma encruzilhada quanto à questão do bem-estar animal. O país precisa começar a definir o seu futuro em uma série de aspectos que permeiam o tema, como transporte, sistemas de produção e procedimentos de manejo. Com o bem-estar ganhando cada vez mais importância para o consumidor, o Brasil precisa definir se adota uma postura de líder mundial do agronegócio e investe em pesquisa, extensão e ensino, formando assim toda uma base científica para basear suas decisões, ou se fica refém das resoluções aplicadas em outros países.
A América do Sul concentra apenas 3% das pesquisas mundiais relacionadas a bem-estar, com a Europa e América do Norte dividindo quase meio a meio o percentual restante. Os resultados dos estudos passariam a ser os principais balizadores em discussões e decisões sobre o tema, que envolve sociedade civil, setor produtivo e governo. “No Brasil temos profissionais com excelentes credenciais na área de bem-estar animal. Temos um agronegócio vibrante, que detém um terço do nosso PIB. E temos um déficit imenso de pesquisas apropriadas para as perguntas relacionadas ao tema bem-estar. Esses desafios serão resolvidos quando todos conversarem. Os atores dessa área estão fragmentados”, comenta Adroaldo José Zanella, professor em bem-estar animal na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ-USP).
Especialista no assunto, Zanella construiu toda sua trajetória acadêmica no exterior, passando por universidades como a de Cambridge, no Reino Unido, onde completou seu PhD em 1992, tornando-se o primeiro veterinário no mundo com doutoramento em bem-estar animal. Retornou ao Brasil em julho de 2013 para assumir a cadeira de professor na FMVZ-USP e atualmente lidera a iniciativa de criação de uma rede nacional de bem-estar animal, envolvendo grupos que trabalham com o tema em todo o país. “No Brasil existem ações excepcionais, mas falta a formalização. O nosso objetivo é lançar essa rede nacional de bem-estar animal como forma de organizar as pesquisas e os outros atores da cadeia produtiva no país. Não necessariamente ficando apenas em animais de produção. O bem-estar atua em todo o âmbito das nossas relações com os animais”, afirma Zanella.
Nesta entrevista à Avicultura Industrial, o professor da FMVZ-USP explica a importância de o país possuir uma rede conectando grupos de excelência no âmbito acadêmico, fala sobre o desenvolvimento dos chamados biomarcadores de estresse, destacando ainda as pesquisas e os desafios em bem-estar animal. Confira.
Avicultura Industrial – Como o senhor avalia a preocupação com o bem-estar animal aqui no Brasil, levando em consideração a academia, a indústria e o consumidor?
Adroaldo José Zanella – A área de bem-estar animal é relativamente nova. A primeira cátedra surgiu em 1986 na Universidade de Cambridge. No Brasil, temos eventos tratando desse tema desde o início dos anos 1990. O bem-estar animal foi imediatamente percebido por aqui dado a presença e liderança brasileira no mercado de exportação, atrelado ao fato de os empresários do setor produtivo navegarem frequentemente em ambientes internacionais. O que ocorreu no Brasil foi o rápido crescimento dessa questão. O agronegócio, em algumas áreas, tem adaptado departamentos específicos para trabalhar o bem-estar animal. Agora, provavelmente o que mais incomoda a academia é a fragmentação dessas questões.
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