A reação da economia brasileira começa a mostrar seu primeiro grande gargalo, com a iminência de um apagão logístico este ano. A estimativa é de executivos e empresários do setor de transporte rodoviário de cargas, preocupados com a forte demanda do segmento no País, aliada à falta de aportes em infraestrutura logística nos portos brasileiros. Segundo algumas empresas do setor, é possível dizer que o “apagão logístico” afetará o País este ano.
A empresa Braspress, que pretende crescer 20% em 2010 e atingir o faturamento de R$ 550 milhões, é uma das que acreditam que este ano o apagão logístico será inevitável. O diretor comercial Giuseppe Lumare Jr. vê inclusive o reajuste do frete como extremamente necessário para capitalizar as empresas; entretanto, os gargalos do setor irão inflacionar a demanda. “Não pretendemos crescer mais do que isso por não ter como garantir a qualidade dos nossos serviços. Precisamos recuperar a rentabilidade perdida através dos descontos concedidos, e selecionar os clientes ao qual atenderemos”, comentou o diretor, em entrevista ao DCI.
Segundo Lumare, no começo do ano passado a empresa teve de se adaptar rapidamente para enfrentar a crise financeira global e tomou algumas medidas drásticas. “Ao deparar com a crise, modificamos nossos planos, dispensamos profissionais preparados, vendemos caminhões, e concedemos descontos”, recordou ele. Entretanto, a retomada da economia nacional no ultimo trimestre, aliada ao reaquecimento acelerado do setor fizeram com que as transportadoras de cargas contratassem empregados sem treinamento, comprassem novos caminhões a altos preços e prestassem até serviços de baixa qualidade, afirmou o executivo. “Fechamos o ano com um aumento de17% no faturamento, porém tivemos grande redução em nossa rentabilidade”, disse ele.
A previsão da transportadora para este ano consiste na reposição da rentabilidade e reestruturação para acompanhar o crescimento do mercado nos próximos anos de forma sustentável. “Pretendemos crescer no máximo 20% este ano. Para isso iremos reajustar o frete em aproximadamente 14%, além de analisar com cuidado os contratos pouco rentáveis”. A empresa paulista pretende investir R$ 50 milhões este ano em expansão e inaugurar novo terminal em Guarulhos (SP).
Outra do segmento que crê em um caos logístico é a Ramos Transportes, que limitou seu crescimento a 15% e não fará investimentos este ano, mesmo acreditando ser possível crescer mais. “Não acompanharemos o mercado. Temos de crescer dentro da capacidade instalada da empresa. O Brasil não está preparado para a demanda que recebe. Existem muitos gargalos e o “apagão” é iminente”, ressaltou o vice-presidente da empresa, Jacinto Junior. Junior afirmou que em 2009 a previsão de crescimento era 10% e devido a crise que afetou o País, a recuperação no ultimo trimestre não conseguiu alcançar o patamar desejado. “Não tínhamos capacidade de estrutura para suportar o aumento do período. Crescemos 7%.”
Este ano, a transportadora pretende faturar aproximadamente R$ 450 milhões e crescer 15% em relação ao ano passado. “Vamos limitar o nosso crescimento para nos adequarmos à capacidade de investimento. A ideia é recuperar o que perdemos por causa da crise”, emendou o executivo.
A empresa também prevê fazer uma seleção de seus clientes, mas afirma já ter sido procurada por muitos clientes da concorrência que reclamavam de maus serviços prestados por elas. “Fomos procurados por diversas empresas interessadas em trocar de transportadora, por causa de atrasos e serviços ruins. No entanto, muitos clientes nossos também saíram alegando isso.” Para ele, este é um termômetro do apagão: a falta de estrutura para atender a demanda. Com 68 unidades no território nacional e há 72 anos no mercado, a empresa aposta principalmente no potencial das Regiões Norte e Nordeste.
Pesquisa
O cenário do transporte rodoviário de carga no fim de 2009 não era o desejado pela empresas que atuam no setor. Terminais superlotados, falta de caminhões, motoristas e ajudantes causaram expressivos atrasos nas entregas. Segundo pesquisa da Associação Nacional de Transporte de Carga e Logística (NTC&Logística) divulgado este mês, mais de 60% das empresas entrevistadas culparam a falta de infraestrutura pelo mal atendimento aos seus clientes em 2009. Outro dado interessante da pesquisa se refere ao repasse de aumento de frete no ano passado: 64,9% dos entrevistados não repassaram o aumento aos seus clientes, e aproximadamente 27% concederam descontos.
De acordo com o presidente da NTC, Flávio Benatti, quem não conseguiu repassar os fretes naquele período deve compensar agora: “Além disso, é importante que as empresas sejam remuneradas pelos serviços adicionais, como o tempo de espera dos caminhões nos clientes e nos postos fiscais, a permanência da carga nos terminais, a cubagem de cargas volumosas, o manuseio e custos com gerenciamento de riscos, entre tantos outros fatores que contribuem para formar o valor cobrado pelo serviço”.
Conforme a entidade, a crise econômica trouxe consequências graves à atividade e a empresários. “Como forma de se proteger e preservar clientes, eles adiaram investimentos e cederam às pressões do mercado, ou seja, chegaram até a conceder descontos.” Com a retomada da economia, já a partir do segundo semestre de 2009, o mercado encontrou grandes dificuldades para atender à demanda do final do ano com a qualidade e segurança necessárias.
“Diante do quadro em que o setor se encontra é necessário fazer o realinhamento do frete, pois somente assim as empresas poderão cobrir os custos, recompor a margem de lucro e investir para que a demanda seja atendida de forma eficiente e com qualidade”, assegurou Benatti. Apesar do cenário, a previsão é de recuperação. Tanto que na pesquisa da NTC, 45% das empresas do setor de transporte de carga pretendem investir em caminhões neste ano.