As boas margens projetadas para a nova safra nacional de grãos, fibras e cereais devem elevar a renda dos produtores, aumentar os investimentos no setor rural e reduzir o endividamento no campo.
A quebra das safras do norte da Europa pela seca aliada a custos menores e subsídios do governo federal serão a “ponte” para atravessar um ano que se desenhava negativo em termos de preços e rentabilidade.
O faturamento bruto do setor deve subir 1%, chegando próximo do recorde de 2008. E as exportações em 12 meses superaram a marca histórica de US$ 72 bilhões. “O cenário é positivo, mas depende de análises individuais”, diz o diretor de Agronegócio do Banco do Brasil, José Carlos Vaz. “No Centro-Oeste, os mais capitalizados vão investir e os mais endividados vão pagar. No Sul, quem não for afetado pela seca fará o mesmo. Se perder até 15% ou 20%, o preço vai compensar eventual quebra”.
No caso da soja, as margens médias projetadas por consultorias e bancos, como o BB, vão de 47% a 86% em Mato Grosso até 100% a 140% no Rio Grande do Sul. Para o milho, vão de 20% a 50% em Goiás a 30% a 55% no Paraná. Os cálculos não levam em conta investimentos, aquisições ou dívidas prorrogadas, mas apenas desembolsos diretos. “Estou otimista, o preço era para despencar, mas está positivo. Se tivesse mais capital, faria opções e esperaria o preços subir ainda mais”, diz o presidente da Associação dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), Glauber Silveira.
Quem vendeu a saca a US$ 17 viu o preço subir a US$ 21. “Vai ser um ano bom, de médias boas. Mas tem gente com dívidas. A margem média não é maravilhosa e o clima pode mudar tudo”, adverte Silveira. O câmbio também é um perigo. Com soja a US$ 21 e dólar a R$ 1,65, o preço roça os R$ 35. Mas se a cotação recuar a US$ 17 e o dólar se mantiver igual, o preço cai a R$ 28. “O mínimo seria R$ 35 para cobrir custo e dar margem”, diz Silveira.
Há três meses, não havia perspectivas de “sobras”. O cenário era desanimador: a safra cheia de soja derrubaria o bushel a US$ 8,50 ou US$ 9. No milho, haveria uma safrinha grande com problemas para exportar. Os estoques acima de 10 milhões de toneladas pressionariam os preços. Agora, o cenário mudou. Em 12 meses, os preços da soja subiram 15% em dólar. O milho decolou 37% e o algodão, quase 70%, segundo o Ministério da Agricultura.
A retomada da demanda, especialmente na China, a redução dos estoques mundiais e a produção menor mexeram nas cotações. “Os preços estão bons e vamos ter margens boas. Mas os passivos ainda pesam”, avalia o diretor da Federação Brasileira de Bancos, Ademiro Vian. “Por isso, é hora de botar a casa em ordem. Rever custos, refazer planejamento e reduzir dívidas. Se tiver que ajustar, é um bom momento porque as crises são cíclicas”.
O recado vale para dívidas de investimento de produtores de algodão, soja e café. A Febraban estima haver R$ 117 bilhões de empréstimos ativos na carteira agrícola do sistema financeiro nacional, inclusive BNDES.
Há ainda problemas pontuais na liquidação da safrinha em Mato Grosso, onde o governo gastou quase R$ 885 milhões para apoiar produtores de milho. Desde 2008, segundo a consultoria AgroSecurity, que analisa cenários para o BB, a liquidez caía junto com preços e o câmbio era desfavorável. A pressão para pagar contas de investimento aumentava a incerteza.
Agora, já tem “alguma sobra” para acertar contas históricas. “O câmbio tende a subir, não deve cair muito mais. Não haverá descasamento negativo do dólar no plantio e na colheita”, aposta José Carlos Vaz. E ainda que haja uma quebra por causas climáticas será “positiva” em preços e reduzirá riscos de liquidez. “Hoje, os produtores estão em uma posição mais confortável, podendo até sofrer eventuais perdas moderadas em um cenário de oferta mais apertada”, diz o economista Fernando Pimentel, da AgroSecurity.
Agora, o “mercado de clima” da América do Sul influencia a bolsa de Chicago, o que serve em parte como um “seguro” para o produtor brasileiro. Na soja, já houve ganhos de R$ 4 a R$ 7,50 no campo, o que levou produtores do “break even” (ponto de equilíbrio) à rentabilidade. “O Cerrado agora está em um momento único, em particular Mato Grosso. Os projetos de logística em andamento dão nova perspectiva. E a agroindústria vai propagar projetos por todo o Estado, buscando matéria-prima na origem e escoamento mais barato”, avalia Pimentel.
No algodão, é só alegria, já que a arroba na Bahia chegou a R$ 71. Em Nova York, bateu US$ 1 por libra-peso após 15 anos. Mesmo quem “errou a mão”, vendendo ainda no primeiro semestre, deve ter lucro de R$ 1,5 mil por hectare, calcula a AgroSecurity. Até aqui, as coisas parecem ficar mais claras. “O cenário é muito bom. Vendemos a US$ 0,75 (libra-peso), bem acima do custo”, diz o presidente da associação dos produtores (Abrapa), Haroldo Cunha. No milho, a exportação pode passar do recorde de 11 milhões de toneladas – antes, esperava-se 8,5 milhões.
No caso do arroz, também há perspectivas favoráveis. Mesmo com preços baixos, as margens são positivas. Choveu bastante, as barragens estão cheias e um La Niña no Sul favorecerá as lavouras irrigadas com mais produtividade, avaliam as análises de bancos e consultorias.